March 7, 2008

Câncer não é sentença de morte





Conversando com outros sobreviventes de câncer ouço histórias absurdas, cheias de preconceito e ignorância. Gente que acha, em pleno século XXI, que alguns tipos de câncer podem ser contagiosos!!! Sempre respondo que câncer não é nem contagioso nem incurável, mas ignorância pode ser as duas coisas.

Mas coisinhas assim não se restringem só aos mais ignorantes e toscos ou mesmo aos sádicos e maldosos. Às vezes os bem intencionados também dão seus escorregões. Quer ver só? Ontem, durante minha reunião na American Cancer Society, discuti o meu novo trabalho lá. Entre as minhas funções está a tarefa de tornar as reuniões com os membros mais dinâmicas e interativas.

Para me ajudar, elas me ofereceram uma cartilha com vários destes joguinhos que devem servir como ice-breakers. Um era um bingo com questões relativas ao câncer e o que tem sido feito para o combate da doença, outra era um jogo de perguntas e respostas e o terceiro da lista era um jogo de celebridades. Numa coluna você tinha a tal celebridade, na outra a causa mortis!!!!! Acertou quem disse que todos tinham morrido de câncer, desde Errol Flynn até John Wayne e se as previsões diabólicas se realizarem em breve o coitado do Patrick Swayze. (Claro que ninguém tinha morrido de câncer no fígado, pois ele é bem raro. Não sei se fiquei triste ou satisfeita.)

Quando me explicaram o tal "joguinho" não escondi meu descontentamento. "Peraí, por que temos que falar na celebridades mortas? Para que falar de morte? Por que não colocamos as celebridades vivas que venceram a doença. Gente tipo Lance Armstrong, Sheryl Crow, Eddie Falco, Rudolph Giuliani, Colin Powell, Olivia Newton-John, Kylie Monogue e, se Deus quiser, Patrick Swayze." Isso só citando os conhecidos por aqui. Se fosse aí no Brasil, acrescentaria Ana Maria Braga, Patricia Pillar, Herson Capri e outros cujos nomes agora me escapam à memória.

Já falei para elas que vou usar o tal joguinho como inspiração, mas o meu vai ter um toque bem mais otimista. Sei que é importante honrar as pessoas cujas vidas foram ceifadas por esta doença covarde. Elas devem ser lembradas sempre, pela coragem, pela luta e pela história de vida que nos deixaram. Mas é muito importante para os sobreviventes de câncer que o foco seja a vida, que eles saibam que podem sobreviver, como muitos de nós, que tentamos ao máximo levar uma vida normal. Óbvio que as lembranças e muitas vezes os traumas nos acompanham para sempre, mas nosso objetivo é sempre seguir em frente e encarar a vida de modo positivo, afinal nós, mais do que muita gente, sabemos que ela é uma dádiva.

Talvez a minha missão seja esta: mostrar aos outros que viver e ser feliz depois de uma experiência tão dolorosa é possível. Talvez meu dever seja lutar contra o preconceito e contra a ignorância e mostrar tanto aos pacientes quanto aos familiares e amigos e até mesmo os curiosos que o câncer não é seletivo e não tem cara. Ou talvez tenha muitas caras: a minha e a de milhares de pessoas espalhadas mundo a fora que decidiram que apesar dos obstáculos vão lutar e vão viver felizes por muito tempo.

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