May 19, 2012

Quem perde avó fica um pouco órfão...

Sempre me perguntei como alguém pode seguir adiante depois de uma grande perda. Como é que a gente acorda de manhã, se veste e vai trabalhar depois de perder alguém que amamos assustadoramente? Será que alguém pode mesmo ser feliz depois que perde uma das pessoas que mais amou na vida? Como se faz para sorrir de novo? Para achar alegria?

Acho que nunca quis pensar muito que um dia eu teria que descobrir estas respostas sozinha, e mais, nunca quis imaginar que este dia estaria tão próximo. Não que eu tenha as respostas, longe disto, mas agora atravesso um período escuro e solitário, vivencio uma enorme lacuna que engole a minha alma. É muito mais intenso e profundo que qualquer um possa imaginar.

Como acontece com as experiências mais marcantes na vida, não existe maneira de se preparar para a morte de alguém que amamos. Nem a ordem natural das coisas, nem o sofrimento do ente amado, nem o cumprimento de sua missão na Terra...nada parece fazer sentido e justificar como de uma hora para outra ficamos sem alguém que significou tanto na nossa vida.

O que mais me doi é imaginar que alguém que tinha uma dimensão absurda e ocupava um lugar tão importante na minha vida não vai passar de uma foto num porta-retrato para o meu filho, que obviamente não se lembrará da Bisa que tanto o amou. Amou-o tanto que horas antes de nos deixar me perguntava: "Como está o nosso Joaquim?" E isto machuca. Ele não vai poder vivenciar a sua doçura, seu afeto, sua dedicação, sua sabedoria, seu amor, como eu tive a sorte de fazer.

Agora me pergunto como fazer para que em algum momento, quando tiver entendimento suficiente, ele entenda a importância que a minha avó teve na minha vida. É difícil de explicar, em primeiro lugar porque o nome "avó" é pouco para ela. Como há pouco me disse minha irmã, ela foi mãe, de verdade. E não desmerecendo a minha mãe, muito pelo contrário, as duas se complementavam de uma forma perfeita no papel mais importante que pode haver na vida de uma criança, ou, no nosso caso, de três. 

E por isto hoje nós choramos muito e vamos chorar durante muito tempo, pois não perdemos uma avó, que só nos via nas férias ou no fim de semana. Perdemos uma mãe, que foi presença constante durante toda a nossa vida. E mesmo no meu caso, que passei grande parte do tempo longe, ainda assim, os laços com ela nunca enfraqueceram: cartas, telefonemas, skype, visitas, sempre a senti muito perto de mim.

E enfrentando esta enorme perda, me dou conta de que no meu caso, ao perder a minha avozinha me tornei um pouco órfã...Só quem teve a sorte de morar com sua avó ou crescer assim tão perto dela pode entender o que eu digo ou ter alguma ideia da dimensão da minha dor.

May 17, 2012

Adeus, Vovó


Bubinha querida,

Me custa acreditar que você não está mais aqui comigo. Que daqui a pouco, quando acordar, não vou poder ligar e pedir para ouvir a sua voz. Eu sei, os últimos meses foram difíceis e a cruz ficou pesada demais. Entendo que você esta melhor agora, descansando ao lado de Deus e dos anjos, onde é seu lugar. Mas para mim, a dor ainda é grande demais. Sou egoísta, queria você entre nós eternamente.

Você sempre foi  minha inspiração, minha referência, meu dicionário e meu norte. Sempre com um conselho carinhoso, ou uma palavra afetuosa na hora certa. É tão difícil imaginar que não vou ter mais seu colinho, Vovó. A dor é tao enorme que me deixa inerte, tão profunda que lateja no meu peito, tão real e ao mesmo tempo tão distante.

Não acredito em morte e em fim. Acredito no amor e na fé de que aqueles que amamos estarão sempre conosco, mesmo quando não podemos vê-los ou ouvi-los mais. Sei exatamente onde você está, Vovó: bem aqui, do lado esquerdo do meu peito, de onde jamais sairá. Você está também em cada bom livro que eu ler, em cada filme de suspense que prender minha atenção, ou em cada sorriso do nosso pequeno Joaquim, que vai ouvir falar muito da Bisa que ele teve a felicidade de conhecer.  

Pois é Vovó, Deus mais uma vez me atendeu, quando implorei a Ele que deixasse que você conhecesse meu filho. Que felicidade inigualável tive ao colocar o Joaquim nos seus braços. Prometo, Vovó, que vou contar cada história que você nos contava quando crianças e que vou contar a ele as histórias da nossa família para que ele saiba de onde veio e quem eram as pessoas maravilhosas que vieram antes dele.

Hoje é um dia muito triste para mim, Vovó, mas longe de mim me revoltar com a sua partida. Você lutou o quanto pôde e a cada momento que viveu deixou sua marca em tantas pessoas que te amam, em forma de lembranças, de ensinamentos e de amor. Você desempenhou com perfeição o papel de avó e de mãe ao mesmo tempo. Ter você em nossas vidas foi uma enorme bênção e seus ensinamentos seguirão com cada um de nós até nossos últimos dias, eu prometo.

Obrigada por tudo, Vovó. Descanse em paz, você merece. Te amo para sempre.

Sua neta,

Dani






May 11, 2012

Time Magazine e as Mães da Libéria

Por aqui não se fala em outra coisa que não seja a capa da revista Time. Na foto uma mãe oferece o peito a seu filho, de três anos, que está de pé numa cadeirinha. Os dois olham para a câmera. Como aqui nos EUA, tudo é levado ao extremo, tem gente achando o máximo e outros achando o cúmulo do absurdo, uma indecência. Pouca gente, como eu, ficou indiferente.

Aliás, eu que sou sempre tão inflamada, me surpreendo com a minha reação a muitas coisas que envolvem a maternidade de um modo geral -- sou indiferente. Contanto que não haja maus tratos, cada um faça o que achar melhor ao criar seus filhos. Mas pelo amor de Deus, pense mil vezes antes de criticar os outros ou, pior, se tornar militante fanática. Acho este tipo de mãe um porre! Só elas sabem de tudo, só elas fazem tudo, têm complexo de mártir. Ficam desleixadas porque não tem tempo para si mesmas já que sua vida se resume aos filhos. Na cabeça delas, mãe que usa baton é fútil e egoísta.

Quando engravidei e logo depois que tive o Joaquim, passei muito tempo pesquisando coisas na internet. Também passei a frequentar grupos de mães locais, só que aos poucos fui me sentindo uma verdadeira estranha no ninho. Ao contrário da maioria das mães que queriam largar tudo e choravam só de pensar em deixar seu bebê na creche, eu contava os dias para voltar ao trabalho. Não que quisesse abandonar meu filho aos cuidados de terceiros, mas queria respirar, trocar ideias com outros adultos. Ao contrário das outras mães, que queriam ficar quietinhas no ninho, eu continuava querendo dar o melhor de mim no trabalho e galgar a próxima promoção. Sempre fui assim, preciso de estímulo externo. Dizem que sou extrovertida, acho que deve ser verdade. Também sou ambiciosa, mas no bom sentido. E ao contrário do que muita gente me disse, a maternidade não tirou isto de mim.

Longe de mim condenar as mesmas mães que preferiram ficar em casa com seus filhos. Acho um trabalho nobre, mas em nenhum momento acho que elas sejam melhores do que eu ou do que mulheres que optaram por não exercer a maternidade. Não ser mãe não desqualifica mulher nenhuma, muito pelo contrário, se for uma opção consciente, merece muito respeito, afinal o mundo está cheio de filhos de chocadeira! Sempre pensei assim e não mudei de opinião depois do nascimento do meu filho.

Durante a minha recente viagem a Libéria não pude deixar de reparar a atitude completamente diferente das mulheres africanas quanto à maternidade. Embora com muito menos condições do que as mães dos afluentes subúrbios americanos, as mulheres da Libéria equilibram muito bem seus negócios e a maternidade. Muitas têm os filhos consigo e outras contam com familiares ou empregados para cuidar deles. Ao contrário de muitas mães aqui, não reivindicam medalhas de honra ao mérito e não se auto-intitulam mártires ou seres superiores. Fazem o que suas ancestrais faziam séculos e séculos atrás.

Na Libéria, um país arrasado por uma guerra civil de 14 anos e onde a maioria das mulheres trabalha loucamente para manter a família, ninguém precisa bater no peito para dizer que é mãe. Para as mulheres da Libéria, a maternidade é linda (todas têm MUITOS filhos e ainda adotam MAIS!), mas não deixa de ser uma coisa absolutamente normal.

 Acho que tem muita gente precisando aprender com elas.



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Fotos de Sumaya Agha

May 9, 2012

I Be Liberia

Tem vezes que fotos dizem mais que mil palavras e no caso da minha viagem a Libéria, um dos países mais pobres do mundo, esta é a verdade absoluta. Como nunca tinha ido à África, não tinha a menor ideia do que esperar.E mesmo de acordo com amigos que conhecem o continente de cabo a rabo, não há muito o que dizer sobre a Libéria, uma país destruído por 14 anos de guerra civil e sem a menor infraestrutura disponível --não há eletricidade (só por gerador), não há sinais de trânsito ou hospitais em funcionamento. Fui com um certo medo do desconhecido e voltei encantada com a resiliência do ser humano e com capacidade das pessoas de colocar em prática seus sonhos, mesmo em circunstâncias extremamente desfavoráveis. Conheci lugares que jamais sonhara em visitar e pessoas que nunca teria a chance de encontrar e que me transformaram profundamente. Ao olhar nos olhos de uma jovem empresária de 30 anos quando ela diz que sua família perdeu tudo na guerra mas ela nunca pensou em abandonar seu país e nem deixou de sonhar em ter seu próprio negócio, entendo perfeitamente o significado da palavra sobrevivente. Incrível perceber que a expressão dela é bem parecida com a minha, quando me perguntam como reagi à minha doença. É estranho perceber o quanto temos em comum: eu uma mulher de classe média brasileira, educada nos EUA e ela, hoje uma empresária de sucesso num país paupérrimo como a Libéria. a verdade é que nós duas recebemos um punhado de cartas ruins em um determinado ponto de nossas vidas. Mas invés de desistir, não abandonamos o jogo, talvez até por acharmos que não tínhamos outra escolha. Seguimos em frente e estamos aqui para contar e viver nossas histórias. Me enche de felicidade saber hoje que o meu trabalho é contar as histórias destas pessoas fascinantes. A certeza que fica é que viver vale muito a pena, não tem doença ou guerra que mude isto.