October 30, 2009

Lilian...

Ontem quando meu telefone tocou, vi o nome da Lilian, mas logo imaginei que nao fosse ela do outro lado da linha. Imediatamente pensei no pior. Nos ultimos meses, a doenca da minha amiga tinha se espalhado com uma furia impressionante e ela ficava cada dia mais fragil e mais distante, ja ciente da gravidade da doenca e do dificil prognostico. Lilian sempre teve muita fe, mas nunca perdeu a lucidez. Talvez por ser enfermeira de formacao, soubesse mais do que nos leigos.
Entao ontem a tarde, quando atendi o telefone, a voz nao era a da minha amiga, mas a de Danny, o marido da Lilian. “Dani, a Lilian faleceu agora a tarde e eu me senti compelido a ligar para voce para avisar, pois voce sempre esteve ao nosso lado nestes momentos tao dificeis,” ele foi logo me dizendo. Para falar a verdade nao sei o que me emocionou mais, a morte da minha amiga ou o gesto do marido dela, um homem jovem, mas muito serio e seco, na maioria das vezes. “Ela gostava muito de voce e voces tinham um laco forte, entao queria te avisar que o enterro sera no domingo, as nove da manha,” Danny continuou.
Perguntei a ele sobre os ultimos dias e ele disse que apesar de ter lutado muito, no final Lilian queria paz, que tenho certeza que agora encontrou. Penso tambem que ela foi ao encontro de seu pai, a quem tanto amava e que tinha partido ha menos de um ano, vitima da mesma doenca que levou Lilian. Muito cruel. Mas entao imagino que a minha amiga ja nao sofre mais. Imagino o encontro entre pai e filha e vejo o pai dela dando-lhe as boas-vindas e a levando pela mao para um lugar lindo, cheio de verde, cheio de luz e cheio de paz. Tenho certeza que e la que a Lilian esta.
Ela que tinha tantos planos, tatos sonhos. Ela, que no meio da quimio arrumava tempo para fazer trabalhos voluntarios. Ela, que planejava voltar a trabalhar como enfermeira na oncologia do hospital onde se tratava. Ela, que amava tanto ser mae que queria muito votlar a ser saudavel para dar ao Sebastian um irmaozinho... Mas infelizmente nao pode ser assim.
Penso em Danny, que apesar de jovem se portou o tempo todo como um homem sabio, ficando ao lado da esposa ate o final, deixando a vida em Miami para cuidar de Lilian perto da familia dela, em Baltimore. Penso em Sebastian, um menino de olhos ernomes e espertos, que vai crescer sem ter uma mae maravilhosa ao lado dele. Lilian era louca pelo filho, entao tenho certeza que de onde ela estiver, vai olhar por ele. Durante as sessoes de quimio, ela planejava a festa de dois anos dele, em julho, no unico periodo que ela teve de descanso entre quimios e cirurgias. Fico feliz por pelo menos ela ter podido realizar este ultimo sonho. Penso tambem na mae dela, uma mulher ainda jovem que aos poucos tenta se recuperar da perda do companheiro de 45 anos, e agora perde a filha mais nova. Rezo para que Deus console seu coracao, pois nao imagino dor pior. Espero que pelo menos Sebastian sirva-lhe de consolo e lhe de a esperanca para seguir em frente.
Ontem voltando para casa, me dei conta que todos os doentes aos quais me apeguei durante as visitas ao hospital ja partiram. Primeiro o Todd, depois a Monica e agora a Lilian. Fico tentando entender o motivo ... Pensamentos morbidos me vem a mente. Tenho medo. Mas ontem o Blake me disse uma coisa que me deixou um pouco mais em paz. “Deve haver uma razao para que voce os conhecesse, talvez voce tenha podido trazer a eles um pouco de esperanca e conforto no final.” De todos os motivos que encontrei, a explicacao do Blake e a que me faz sentir melhor. Nestas horas so posso imaginar que a missao dos meus amigos foi cumprida e que Deus resolveu assim os chamar mais cedo para o lado dEle.
Ironicamente o enterro da Lilian vai acontecer na manha de domingo, primeiro de novembro, meu aniversario e Dia de Todos os Santos. Apesar de seguirmos religioes diferentes, a nossa fe era muito parecida, entao tenho certeza que neste Dia de Todos os Santos, o ceu celebra a chegada de um anjo.
Va em paz, Lilian. Voce vai fazer mutia falta.

October 29, 2009

Halloween é o ....


Tenho um segredo para confessar. Correndo o risco de ser tachada de chata ou estraga-prazer, digo que detesto Halloween. Vivendo aqui nos States, isto tem o mesmo peso do que um carioca dizer que detesta carnaval. É mais ou menos por ai... Claro que guardadas as devidas proporcoes. Halloween nem feriado é, entao o martírio é ínfimo se comparado aos quatro dias de carnaval para os que detestam a folia do Momo.

Não sei muito bem o motivo desta minha aversão, mas desconfio que haja varios. Em primeiro lugar, morro de medo de almas penadas, bruxas, vampiros e tudo do gênero. Vi o Fantasma da Ópera quando pequena e quase surtei, até para terapia tive que ir. Twilight?! Estou fora, nem pensar, pra mim a vida ja e assustadora o bastante. Já vivo estressada naturalmente para que procurar razões sobrenaturais?

Também não gosto de me fantasiar. Acho que este tipo de coisa tem data de validade. É fofo em crianças, mas em raras exceções, em adulto parece coisa de retardado. Não nego que já tenha ido a muitas fantasias no Rio, estilo Tere Fantasy e coisa do tipo – aliás quem nunca foi a uma destas? Mas o stress de procurar fantasia é totalmente desnecessário. Nunca me esqueço de uma vez que aluguei uma fantasia pra mim e outra para a Andressa, uma dançarina de flamenco e outra de dançarina do ventre. No final, nós duas queriamos e mesma fantasia e quase saimos no tapa!

Mas acho que o grande trauma vem mesmo dos meus tempos em Nova York, quando a parada de Halloween acontecia na minha rua e justo na vespera do meu aniversário, quando eu sempre me organizava para o dia seguinte, comprando coisas para a festa. Alguém já experimentou atravessar a Sexta Avenida no meio da parada? Melhor nem tentar... Coisa infernal! Eu, que já sou estressada por natureza, morria de vontade de esganar todo Drácula ou Frankenstein que me aparecesse pela frente. Nem as simpáticas vaquinhas holandesas escapavam da minha ira...

Mas os anos foram passando e eu quase me esqueci desta minha implicância...até que voltei a morar aqui. E não é que hoje recebo um memorandum simpático da diretoria do emprego novo “convidando todos a vestirem suas fantasias amanhã”!

Ninguem merece...muito menos eu! Será o fim do meu inferno astral? ;)

October 28, 2009

Requiem de Um Sonho (Americano)

Ainda nao li todas as propostas de reformas para o sistema de saude norte-americano. Para ser sincera, duvido que algum dia eu venha a completar esta tarefa. Nao por falta de interesse, mas po falta de tempo para me dedicar a algo que merece uma analise mais do que cuidadosa.

Esta semana, a midia americana, que tinha declarado morta a opcao por uma alternativa publica, foi surpreendida com a declaracao do lider da maioria, que revelou que encaminharia a proposta com a tal opcao publica. Claro que ha criticos e ardentes defensores dos dois lados da questao.

Eu nao tenho condicao de julgar coisa nenhuma, mas a unica pergunta que me persegue e o que sera feito com as pessoas que nao podem obter cobertura de um plano de saude. Nao estou falando de imigrantes ilegais, ou de jovens ou trabalhadores de baixo nivel educacional cujos empregos nao oferecem tais beneficios, pois em teoria a unica coisa que os impede de ter acesso aos planos de saude existentes e o custo. Nao que isto nao seja um problema, e grave, mas a solucao ainda que dificil e obvia. Eles tem acesso aos planos, mas nao tem dinheiro para pagar a mensalidade, entao ha de que se criar planos de qualidade e preco acessivel que atendam este tipo de demanda mais do que justa.

O grupo ao qual me refiro se encontra em situacao ainda pior. Este grupo e formado de pessoas que se dispoem a pagar os precos muitas vezes abusivos dos tais planos, mas sequer tem esta opcao. Voces acham que este tipo de gente nao existe? E se eu disser que este grupo marginalizado e o grupo no qual me incluo? E a mais pura verdade. Eu, residente legal, com faculdade e mestrado realizados nos EUA, ex-bolsista do governo americano, que pago meus impostos em dia e contribuo para a economia deste pais, nao posso comprar um plano de saude individual se eu quiser. Repito, NAO POSSO. Mesmo que me disponha a pagar $1000 por mes, esta opcao nao existe para mim. Esta semana o plano de saude Blue Cross Blue Shield, que coincidentemente e o mesmo plano que tenho atraves de meu empregador, me enviou uma carta me explicando que devido ao meu historico medico, que inclui hepatocarcinoma nos ultimos dois anos, meu pedido de inclusao nao pode ser aceito. Sem mais. Passar bem.

Gostaria de dizer que fiquei surpresa, mas estaria mentindo. Tambem nao fiquei desesperada, pois afinal tenho outras opcoes. Mas a resposta do tal plano de saude me deixou ainda assim indignada. Me sinto enganada por todo mundo que um dia me disse que se eu estudasse e trabalhasse com seriedade poderia ser totalmente independente, me sustentando e tomando conta de mim mesma. Me senti ofendida ao perceber que em pleno seculo XXI eu tenho sorte de ser casada, e mais, de ter um marido que tem um bom emprego e boa cobertura de plano de saude. Coisa mais ridicula!

Entao imaginei um cenario um pouquinho diferente...so um pouco. Por um instante pensei que eu poderia estar aqui nos EUA ja com meu green card [que teria conseguido de qualquer forma ficando aqui no mesmo emprego por seis anos] mas estaria solteira. Depois de muitos anos de carreira, teria decido ter meu proprio negocio e trabalhar por conta propria, atendendo alguns clientes [o que ja fiz antes de receber meu work permit.] Tudo estaria indo muito bem, mas como autonoma, precisaria comprar um plano de saude individual, ja que sempre fui precavida, e...do dia pra noite descubriria que nao posso. Entao minha alternativa seria abandonar meu proprio negocio e tentar encontrar um emprego qualquer, por mais mundano que seja, que pudesse me oferecer os tais beneficios, como plano de saude. Entao acabaria ai meu tao sonhado “American Dream” .

E aquela historia de que todos sao iguais perante a lei? Parece que nao vale para os que um dica ficaram gravemente doentes...

E dificil entender como algo assim ainda possa acontecer em pleno seculo XXI. E triste demais.

October 27, 2009

Abandono

Nao e intencional, mas o blog tem ficado as moscas. Desde que votlamos da Espanha, parece que estou ligada numa tomada de 220W.

Depois de uma gripe sinistra que me pegou no meio da viagem, que ao que tudo leva a crer foi a Suina, ontem acabei indo ao medico com uma biata dor de ouvido. Ate entao estava bem calma, mas como ja tinham se passado duas semanas e nada de melhora, resolvi nao arriscar.

Depois de esperar pelo medico por duas horas -- Hello, SUS!!! -- o veredicto final: otite e uma baita crise alergica! Resultado: antibiotico por dez dias e Claritin na cabeca!!! Ai que saco! Detesto remedio! Vou ter que ligar pro Dr. Joaquim correndo, pois quando perguntei pra medica se a tal amoxixilina nao ia fazer meu figado explodir, ela me disse "Espero que nao." Fala serio, ne? Que medica e essa!!! E ainda me receitou Claritin ate marco!!! Nem pensar! Vou tomar esta semana pra melhorar minha sinusite e depois, see ya! Nao vou ficar escrava de remedio mesmo!!!

So quem e alergico -- coisa que fiquei depois de velha -- entende o drama. Chega o outono e a gente comeca e espirrar, nunca se sabe se e resfriado, alergia ou gripe...e mesmo assim resfriado e alergia vao se alternando e parecem nunca acabar...

Bem, fico por aqui porque o dia hoje esta punk. Sei que estou devendo emails a Deus e ao mundo, mas e que passei o findi arrasada e a semana comeca pesada, entao um pouquinho de paciencia por favor!

Depois volto com mais calma.

October 24, 2009

España -- Fatos & Fotos

Flamenco no meio de uma praça em Sevilha -- só podia ser Sevilha!

Sagrada Família -- dispensa legenda!


Vista do Parador que ficamos em Arcos de la Frontera, Andalucía


Barcelona ao entardecer...

Vista da Catedral de Barcelona

October 23, 2009

Giovanna


Ando muito sumida, mas entre viagem, emprego novo longe pacas e gripe, sobre muito pouco tempo. Este fim de semana prometo que faço umj update rápido.

Enquanto isto, não pude resistir e colocar a foto da minha sobrinha mais nova, a Giovanna, aqui no blog. Não é uma bonequinha?

October 17, 2009

Sevilla

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Não pode se viajar pela Espanha sem se deixar levar pelos sentidos. Nada aqui pode ser descrito com exatidão, tudo é mais.

A Espanha é um lugar para ser experimentado, para ser vivido, para ser sentido na pele, como este sol andaluz, forte e intenso mesmo no meio do outono.

Os aromas deste lugar são inebriantes e estão por todas as partes, jardins, restaurantes e palácios, tudo tem um cheiro único e particular.

As paisagens são coloridas, vibrantes e parecem convidar o viajante a se perder nelas, viajando através de lendas e civilizações.

Os sabores são especiais e para mim tem um gosto especial de infância, de algo bom e pueril que ficou perdido em algum lugar mas que é aos poucos resgatado através desta viagem aos sentidos.

Tudo aqui é música, em cada esquina, de todos os gêneros. Desde uma velha cigana entoando uma canção típica no meio de uma rua deserta no Centro de Sevilla, até um violeiro solitário num beco perdido em Barcelona. Não se pode andar sem ser pego de surpresa pelo som de uma voz ou de um instrumento.

E por fim o toque, que aqui não se limita ao corpo, pois uma viagem à Espanha toca qualquer um na alma.

Ao que parece nesta viagem faço as pazes com a terra dos meus avós. Quando vim a Madrid, há mais de 10 anos, confesso que fiquei um pouco decepcionada. Talvez viesse esperando encontrar um pouco de mim, o que não acontenceu. Desta vez, acho que vim pensando mais em me perder e acabei me achando.

October 12, 2009

Unplugged...pero no mucho!





O Blake acabou trazendo o computador e cá estou eu postando diretamente do nosso quarto em Barcelona.

A viagem está sendo perfeita e tudo tem superado nossas expectativas -- desde a localização e o nível de conforto do hotel até a temperatura agradabilíssima.

A cidade é sensacional e tem uma energia impressionante, mas para mim o que faz esta viagem especial é estar aqui, no mesmo país de onde partiram meus avós há quase um século em busca de uma vida melhor.

Estar na Espanha é de certa forma uma volta à casa para mim. Não casa, no sentido de lar propriamente dito, mas uma jornada interessantíssima de volta às minha raízes. Quando a minha irmã passou umas semanas aqui há alguns anos, me lembro que ela disse "Estar na Espanha me fez entender muitas coisas sobre o papai."

Agora entendo completamente o que ela disse. Muito embora meus avós tenham nascido no outro extremo do país, vejo muito da personalidade deles e do meu pai aqui. É incrível como cultura transcende geografia. Nestas horas a gente percebe de apesar de passarem mais de cinquenta anos no Brasil, meus avós preservaram muito da cultura que trouxeram de casa.

Andando pelas ruas de Barcelona, não há como não sentir a presença do meu pai. Coisas que nos parecem estranhas ou desnecessárias no Brasil, aqui fazem todo sentido. A comida, sempre acompanhada de pão. Ovos acompanhando carnes e molhos, muitos molhos... A cultura espanhola é muito parecida com a portuguesa e de certa forma com a brasileira, mas ao mesmo tempo é tão única.

Imagino que o que vejo hoje seja um país completamente diferente da Espanha que meus avós deixaram para trás no início do século XX mas mesmo assim os cheiros, os sons e o ritmo da vida aqui me levam de volta a casa deles, um pedacinho da Espanha escondido num sobrado em Laranjeiras.

October 10, 2009

Espanha Unplugged

Não se trata de show ou disco novo e sim da minha viagem que começa daqui a pouco. Ontem, devolvi meu laptop e meu Blackberry e para minha surpresa em vez de me sentir triste, me senti leve e solta! Tive até pesadelo antes de entregar meus brinquedinhos, mas na hora H, foi mais fácil do que eu esperava.

Então vou tentar continuar assim, pelo menos pelos próximos dez dias. Não sei se o Blake vai levar o laptop dele, mas eu nem celular vou levar. Da última vez que tentamos ficar fora do ar, houve aquela coisa horrível com Dr. Joaquim, então me vi em alto mar acessando uma internet pré-histórica e pagando os olhos da cara, mandando emails pra Deus e o mundo e lendo jornal todo dia para saber que tinham reparado a injustiça. Pois é, graças à atuação leviana da PF, as minhas férias que seriam de descanso absoluto no mar do Caribe foram um stress só.

Mas agora se Deus quiser não vai acontecer nada bombástico nos próximos dez dias. Vou passar por aqui de vez em quando e se o Blake levar o laptop talvez coloque umas fotos. Então enquanto isto, vou passar a bola para meus cyberfriends... Quem quiser fazer alguma pergunta, ou sugerir um tópico para post, o espaço está aberto. Prometo que respondo na volta...

Então agora é com vocês. Vou terminar de arrumar as malas! O próximo post dever ser direto da terra dos meus avós, España! Fico toda arrepiada só de pensar que vou estreiar meu passaporte...Ai, como sou cafona!!!

October 9, 2009

Obama, me chama que eu vou!

Ontem comentando com uma colega de trabalho sobre a recusa que recebi do plano de saúde, ela disse imediatamente: "Está vendo por que quando a hora chegar eu vou lá para Washington marchar a favor da reforma da saúde? Você é a primeira pessoa do meu círculo que me relata uma coisa destas, mas tem muito mais gente por aí," disse Allison, que normalmente é uma das pessoas mais calmas e ponderadas que conheço. "E ainda tem aquela gente idiota que faz escândalo nos town-hall meetings," ela emendou.

E ali, naquele momento, tive certeza absoluta de que lado eu estava. Claro que sempre fui e serei a favor da reforma deste sistema de saúde tão perverso, mas sem ler as mais de mil páginas do tal documento, simplesmente não me sentia à vontade de tomar uma posição mais clara, ou seria radical? Ontem, mais uma vez, vi que eu havia tomado esta posição há muito tempo, só não tinha enxergado isto ainda e conversando com a Allison ficou tudo muito claro.

Voltei para o escritório e recebi o email da Melody, uma mulher de 56 anos que descobriu há pouco um câncer no fígado e buscava alguém que tivesse passado por experiência parecida. Ligou para a Immerman Angels, organização do Jonny, e recebeu meus dados de contato.

Melody me conta que recentemente descobriu ser portadora do vírus da hepatite C, que causou-lhe cirrose hepática que evoluiu para câncer. Ao que tudo indica, sua única salvação é um transplante, mas pelo tamanho e localização do tumor, não é possível/indicado. Só lhe resta então tentar radioterapia/quimioterapia para tentar diminuir o tamanho do tumor para depois quem sabe poder pleitear o transplante. Mas apesar de ter plano de saúde, o pedido de seu médico foi NEGADO!!!! Melody então me pergunta como ficar otimista numa situação destas!

Como?! Ficar otimista quando pessoas sórdidas e mesquinhas lhe negam o direito de viver?! Não faço a menor ideia! Enfrentar uma doença como esta sem perder a cabeça já uma tarefa e tanto. Enfrentar esta doença e ainda ter que lidar com a crueldade de terceiros é missão impossível. A que ponto chegam a ambição e pequinez do ser humano?!

Quando o assunto é saúde e principalmente o acesso a ela, saio do sério. Claro que percebo o quanto tenho sorte em todos os sentidos -- tive um tumor que pode ser ressecado, minha família tinha condições financeiras para custear o tratamento, o seguro-saúde nos reembolsou boa parte das despesas. Infelizmente a maioria das pessoas não tem a mesma sorte.

Então pensei num cenário um pouquinho diferente: eu, solteira, perco meu emprego ou saio dele para realizar o sonho de começar meu próprio negócio de consultoria de comunicação e marketing, por exemplo. Eu, que sempre ouvi dos meus pais que poderia fazer tudo que eu quisesse, que estudei, que trabalhei sério, que sempre acreditei que com instrução e competência seria capaz de tomar conta de mim mesma, me sustentar e viver a vida que sonhei para mim, de repente percebo que nada disto é verdade. A verdade é que por algo completamente alheio a minha vontade, por algo do qual não tive a menor culpa, serei eternamente presa a um emprego, por mais desisteressante que seja, que me dê os tais benefícios, como plano de saúde, de preferência um bom, que cubra os tantos exames e consultas que faço a cada ano. A verdade é que mesmo disposta a pagar uma fortuna por algum tipo de cobertura médica, nenhum plano irá me considerar por causa daquele famoso "C" que eu levo no meu boletim.

E nestas horas o mundo me parece mesquinho e pequeno demais. Injusto e desigual. Felizmente não preciso me preocupar tanto assim com o tal plano de saúde, pois tenho algumas alternativas, mas milhares de pessoas como a Melody não tem. Milhares de americanos tem planos de saúde mas são reféns deles quando realmente precisam dos recursos mais avançados. Outros milhares -- ou seriam milhões -- sequer tem plano, pois seus empregadores não oferecem. Como aqui não há SUS, só que está abaixo do nível de pobreza se qualifica para o Medicaid, assistência do governo, e Medicare é só para idosos. Claro que tem muita gente, incluindo imigrantes ilegais, que abusam do sistema, mas como sempre a grande maioria acaba sendo prejudicada por uma minoria irresponsável.

Ainda não entendo completamente as propostas de reformas do sistema de saúde, mas só sei que do jeito que está não pode ficar. É por estas e outras que agora só aguardo o chamado. Obama, quando chegar a hora de marchar em Washington, me chama que eu vou!

October 8, 2009

O Outro Lado do Sistema de Saúde Americano

Ninguém me entende quando eu digo que AMO o meu plano de saúde aqui nos States. O plano na verdade não é meu, sou dependente do Blake, que como funcionário público federal tem a melhor cobertura e a maior opção de planos de saúde existentes no país. O nosso plano, exclusivo de funcionários do Governo Federal, foi uma mãe na época da minha cirurgia e cobre quantos exames de controle eu precisar, tudo sem pedido de clínico-geral, como muitos planos exigem aqui. Só tem uma coisa que o plano não cobre: tratamento para infertilidade.

Então há pouco tempo, resolvi também optar por um plano de saúde oferecido aos funcionários do Estado de Maryland que oferece este tipo de cobertura. Com 35 anos e só agora podendo começar a tentar engravidar, melhor prevenir do que remediar. Só que como NADA na minha vida acontece como planejado, o projeto ao qual meu trabalho estava vinculado simplesmente acabou e todo mundo aqui recebeu um aviso prévio de 90 dias, como é previsto por lei, então no dia 24 de dezembro -- Feliz Natal, você está desempregado! -- vai todo mundo pra rua.

Como também não sei ser passiva e esperar as coisas caírem do céu -- até porque pra mim parece que elas jamais caem! -- me adiantei, mandei uns CVs, fiz uma entrevista e recebi uma proposta de emprego melhor no mesmo dia que recebi a carta de demissão. Incrível! E apesar das promessas da minha chefe de me vincular a outro projeto/grant, cansei desta brincadeirinha e resolvi pular fora! Amanhã é meu último dia aqui.

Com a viagem para a Espanha no sábado, começo no novo emprego no dia 21 de outubro, assim que chegar. Ainda bem que não costumo sofrer com jetlag. Tudo parece ótimo, menos o plano de saúde deles -- bem básico! -- então resolvi tentar comprar um plano individual por minha conta. Até aí, tudo bem, só que tive que preencher um questionário para que minha proposta fosse avaliada. Normalmente a reposta deles leva umas três semanas, mas para minha surpresa, recebi o email em menos de 24 horas. Resposta: seu pedido foi negado!

Não preciso ser Albert Einstein para entender que um único quadradinho pode ter estragado a minha festa. Câncer?! Nos últimos dois anos?! Pois é, aparentemente não sou saudável o suficiente para comprar uma apólice individual. Diz o email que dentro de 10 dias úteis vou receber uma carta me explicando os motivos e que depois disso posso apelar. Sei não... Se já começou complicado antes mesmo de eu virar cliente, algo me diz que é melhor eu deixar de lado e pensar numa outra alternativa.

Pois é, hoje vi a cara feia do sistema de saúde americano. Confesso que não fiquei nem surpresa nem chateada. C'ést la vie. Graças a Deus pelo plano do Blake!

October 7, 2009

Normal


Aproveitando que outubro é o Mês da Conscientização sobre o Câncer de Mama, ano passado resolvi fazer a minha primeira mamografia. Quem acompanha o blog vai lembrar o perrengue que foi. Obviamente me ligaram do hospital e tive que voltar para fazer mais imagens e novos exames. Nada demais para um ser humano qualquer, mas um susto e tanto para quem tinha tirado um tumor do fígado meses antes. Fora isto, tive outros sustinhos relativos a minha saúde que só aumentaram a minha agonia e o meu pavor de estar doente de novo.

Claro que desde que recebi a tal notícia de que “seriam necessárias mais imagens” até o dia que as tais imagens foram feitas e tive enfim o diagnóstico quase não dormi. Memos depois do diagnóstico fiquei ccom a pulga atrás da orelha até visitar o mastologista da minha mãe no Brasil e finalmente receber uma notícia tranquilizadora: dois microcistos eram vistos nos meus exames, mas tudo indicava que além de muito pequenos eram benignos.

Fiz outra mamografia em maio e a médica pediu outra para seis meses depois. Em pensar que quando fiz a primeira ano passado teoricamente não teria que fazer outra até meus 40 anos!!!! Mas como nada comigo é tão simples como parece, a história foi outra.

Um ano depois do susto, voltei a mesma clínica e a médica disse que está quase certa de que os cistos são somente cistos, então recomendou que voltasse lá não em seis meses, mas em um ano! E se nada mudar, aí sim, minha próxima visita só vai acontecer quando eu fizer 40 anos! Ufa! Agora é rezar para ficar tudo como estar e eu não precisar ficar fazendo mamografia antes do tempo.

Quando o assunto é saúde eu me sinto como se fosse um milionário que perdeu toda a fortuna de um dia para o outro e agora tem que começar do zero, então cada degrauzinho na escada da vida tem um sabor especial. Nasci saudável, nunca tive nenhuma doença grave e até as famosas doenças infantis que tive foram sempre muito brandas. Até que aos 28 anos descubro um megatumor no fígado e o resto vocês já sabem!

Uma vez ouvi dizer que o câncer é como se fosse uma nota “C” num boletim. Não importa o que existia antes ou que vier depois, aquela nota baixa vai estar sempre lá estragando seu histórico médico ou escolar. É mais ou menos assim, sempre fica aquele medo, sempre fica a desconfiança por parte dos médicos, que ao menor sinal de problema, já entram em estado de alerta. Então não é a toa que quando os médicos decidem espaçar um pouco mais as minhas consultas, sinto uma alegria enorme, pois me sinto um pouquinho mais perto da condição de “paciente normal”. Eu sei, me contento com pouco. Mas o pouco de uns é uma imensidão para outros...

E rumo à Espanha para celebrar a alegria da normalidade! Aliás, dicas de Barcelona, Sevilha, Valencia, etc... são muito bem-vindas!

October 6, 2009

Carisma

Tem coisa que nasce com a gente ou não. Não dá para aprender na escola, não há cursos online ou seminários de auto-ajuda. O sujeito nasce com ou sem carisma. Simples assim.

Sempre digo para a Elizabeth que no mundinho do câncer, como a galera aqui insiste em chamar nosso grupinho, a maioria dos homens é sem graça, sem graça, bem estilo "picolé de chuchu," como os jornalistas paulistas gostam de chamar o Alckmin. Competente, comprometido, até gente boa, mas sem graça toda vida. Não que quem não tem carisma não tenha outras qualidades, mas quando se está lidando com pessoas física e psicologicamente frágeis, carisma pode fazer muita falta. Não só as palavras usadas, mas a forma que a mensagem é transmitida, tudo conta muito.

Então é por isto que quando o Jonny Immerman vem a Maryland parece que o mundo para. O cara de um carisma absurdo! Depois de uma coversa com ele, você sai contaminado por tanto otimismo e vontade de lutar. Não se trata de um carisma afetado, de gente que se acha o máximo e que soa ao mesmo tempo pedante e exagerada, mas um magnetismo e uma capacidade enorme de se colocar no lugar do outro, de imaginar como ele se sente e de aconselhar sem ser condescendente.

Além do meu trabalho com o Ulman Cancer Fund, também sou voluntária da Immerman Angels, organização fundada pelo Jonny que conecta pessoas que estão em tratamento com pessoas que tiveram o mesmo tipo de câncer e hoje estão vivas e saudáveis. Jonny tem voluntários nos EUA e em outros países. Apesar de inglês ser a língua principal, ele me disse que tem pelo menos 10 voluntários que falam português! (Devem ser nove, além de mim!)


Muitas vezes me pergunto se algumas pessoas tem a paixão e o comprometimento necessários. Às vezes me pergunto se a missão de ajudar pacientes de câncer não fica muito diluída entre eventos esportivos, shows de rock, cocktails e pulserinhas amarelas que muita gente usa sem sequer saber o que significam. Acho tudo válido desde que se tenha em mente o real objetivo que é ajudar aqueles que lutam arduamente para vencer a doença e ter uma vida normal.

É por isto que para mim, a organização do Jonny é tão especial, pois nada pode substituir este contato individualizado. Nestas horas de tanta dor e incerteza, conhencer, ver e falar com alguém que passou por situação semelhante e hoje vive uma vida normal é uma verdadeira dádiva, já que esperança não tem preço.

October 2, 2009

Rio 2016



Hoje para mim ficou muito claro que a gente pode ter vários passaportes, mas o coração é um só! Apesar de morar nos EUA há anos e adorar este país, apesar dos meus antepassados espanhóis e da minha recente cidadania, na hora do vamos ver, ficou evidente onde a minha lealdade estava. Mesmo não tendo a MENOR simpatia por Lula, Cabral ou Paes, mesmo sabendo que a nossa delegação era o maior trem da alegria as custas do meu e do seu suado dinheiro, não posso negar que me emocionei ao ver todo mundo chorando.

Me senti a própria idiota, cúmplice da detestável política "pão e circo", mas ao ver as imagens da Praia de Copacabana fiquei arrepiada. Me enoja saber que vai ser a maior robalheira, mas se a gente for deixar de viver por causa da corrupção que assola o país, melhor se matar agora mesmo.

Podem me chamar de Pollyanna, mas torço muito para que algo de bom possa ficar para o povo, que o Rio saiba usar esta oportunidade para se tornar um lugar mais justo e digno de se viver. Claro que sei que as coisas não vão mudar do dia para a noite, mas espero que este boost na auto-estima da gente tenha um efeito propagador que possa ser sentido em outras áreas.

Sou otimista, admito, e vou morrer assim. Mais uma lição aprendida a duras penas. Vejo que o sofrimento torna algumas pessoas mais amargas, sempre me recusei a fazer parte deste grupo.