March 6, 2008

Patrick Swayze

Hoje acordei com a perturbadora notícia de que o ator Patrick Swayze luta contra um câncer no pâncreas. Sempre adorei o Patrick Swayze e vi Dirty Dancing umas 10 vezes. Fiquei com o coração superapertado. A notícia em si já é desagradável, porém o mais perturbador de tudo são os comentários que acompanham a informação. Algumas matérias dizem que ele só tem cinco semanas de vida, outras informam que o índice de sobrevivência é de menos de 2% e há pouco acabei de ouvir a correspondente médica do Today Show dizer que "de todos os tipos de câncer, este não seria o melhor a escolher." Com todo respeito à doutora fulana de tal, a tal afirmação é no mínimo um idiotice absurda, pois será que alguém no mundo escolheria ter câncer?

Este tipo de coisa me deixa muito, muito, muito chateada! As pessoas que escrevem estas matérias ou fazem comentários como estes certamente acham que estão imunes a "tragédias" como estas. Não sei de onde tiram esta certeza absoluta de que nunca terão que enfrentar uma doença qualquer ao longo de suas vidas. Eu pessoalmente teria muito medo, afinal enquanto vivemos cada vez mais, estas doenças consideradas graves parecem cada vez mais próximas de nós.

Sei que notícias bombásticas vendem jornal e fazem qualquer conversa no cabelereiro ficar mais apimentada, mas será que não devemos respeito ao paciente e à família que atravessam um período tão difícil? Até que ponto vão a irresponsabilidade e a ganância do ser humano?

Lidar com um diagnóstico destes é das coisas mais difíceis na vida de alguém, pois nunca pensamos no assunto. Não é o tipo de coisa que planejamos. Ninguém em sã consciência vai perder tempo congitando qual será sua reação mediante uma notícia sombria destas, até que um dia isto acontece e não temos a menor idéia de como reagir.

Por que tantas pessoas escondem a doença? A resposta é bem simples, elas simplesmente não sabem como lidar com esta informação e sentem-se muito vulneráveis. Precisam de tempo para digerir esta notícia. Precisam se fortalecer. Precisam enfrentar, mas tudo tem a sua hora.

Quando recebi o meu primeiro diagnóstico levei um tempo para entender minha situação. Nem o médico tinha conseguido pronunciar a palavrinha que começa com "c". Ela falava em tumor, em células que tinham ficado "ruins", em tratamento...mas em nenhum momento usou a palavra "câncer". Então ainda em choque comentei com a minha irmã que estava muito triste com tudo, mas que meu único consolo era que não se tratava de câncer e eu não teria que fazer quimioterapia. Ela olhou para mim incrédula e com os olhos cheios de lágrimas disse: "Dani, acho que você não entendeu muito bem, mas células que ficaram ruins formaram o câncer. O tratamento que você vai ter que fazer é uma forma de quimiterapia."

Depois disso tive que confrontar o pensamento que esteve presente o tempo inteiro lá no fundo da minha cabeça. O pior dos meus pesadelos tinha se transformado em realidade. A única idéia que ocupava a minha mente era: VOU MORRER! Quanto tempo será que me resta? De todos os sonhos que tenho, qual deles vou ter a chance de viver ainda? Provavelmente nunca vou me casar, ou ter filhos... Netos, nem pensar. Jamais vou saber o que é ter o rosto coberto por rugas e linhas de expressão ou ver meus cabelos grisalhos. Nunca vou chegar à "terceira idade." E num instante tudo que nos parece ruim tem um sabor tão diferente. Dali para frente entendi que no meu caso a velhice não era um direito absoluto e sim um verdadeiro prêmio.

Depois de uns dias deprimida e submersa nos pensamentos mais obscuros resolvi que teria que lutar não só contra a doença, mas contra a depressão, o medo e a ignorância, minha e dos outros. Combater a minha ignorância foi relativamente fácil. Comecei a pesquisar e conversar muito com os médicos, pois Francis Bacon tinha razão quando disse que "conhecimento é poder." Só olhando nos olhos do meu inimigo teria chance de vencê-lo. E foi o que fiz e tenho feito até hoje.

Lutar contra a ignorância alheia, por outro lado, tem sido uma batalha um pouco mais complicada. Já perdi as contas de quantas vezes ouvi que já deveria estar morta por um motivo ou por outro. Já ouvi horrores sobre quimioterapia, que no meu caso foi muito tranqüila, pois não tive nenhum dos sintomas esperados. E cada vez que leio uma matéria sobre alguma celebridade com câncer e seu prognóstico ruim é difícil não me colocar no lugar desta pessoa. Se normalmente não gostamos de ser alvo de fofocas superficiais, imaginem o que é ter o mundo inteiro especulando quantas semanas você tem de vida? É muita maldade.

Normalmente não tenho muita simpatia por celebridades reclamando da falta de privacidade, mas quando o assunto é sério, o foco muda radicalmente. Quando ouvi meu primeiro diagnóstico custei um pouco a decidir o que faria, pois de início todos pensávamos se tratar de um tumor benigno. Depois de receber a notícia ruim, aos poucos fui passando a informação aos amigos mais próximos, que foram sensíveis e discretos o suficiente. Só depois, já fortalecida, tornei a informação pública.

Não sei se foi a melhor forma de lidar com o problema, mas foi a melhor naquele momento. Obviamente houve problemas na comunicação e muita gente acabou recebendo a notícia truncada, mas no final ficou todo mundo feliz porque eu estava bem.

Na segunda vez, minha reação foi muito mais rápida e lúcida, afinal agora eu já estava experiente. Sabendo que jamais conseguiria contar o caso em detalhes para meus amigos que estavam espalhados nos quatro cantos do planeta e para evitar o disse me disse, resolvi mandar um email resumindo toda a situação. Contei aos meus amigos exatamente tudo que sabia sobre meu caso e como pretendia enfrentar a situação: a cirurgia, o tratamento, o prognóstico, etc. Além disso pedi muitas orações.

O email foi enviado somente a pessoas amigas que eu tinha certeza estariam torcendo por mim. Pedi que fossem discretas e comentassem somente com algumas pessoas. Hoje, já 100% recuperada, não vejo nenhum problema em tornar a informação pública outra vez, mas naquela hora tudo que eu menos queria era a "pena" de quem nunca tinha feito parte do meu grupo de amigos. Detesto que pessoas estranhas me vejam como coitadinha e me olhem com uma pseudo-piedade perfeitamente dispensável.

Sempre fui e continuo sendo uma pessoa completamente normal. Verdade que às vezes o meu caminho é um pouco acidentado, mas isso é bom, pois me deixa sempre alerta e nunca me deixa esquecer que a vida é uma dádiva que deve ser sempre valorizada. E sobre as estatísticas que cismam de nos empurrar goela abaixo, vou citar uma das frases mais famosas do sábio Mark Twain: "Há três tipos de mentiras - mentiras, mentiras malditas, e estatísticas".

E abaixo incluo um link para quem tiver tempo e quiser ler um dos textos mais verdadeiros sobre estatísticas em câncer. Descobri no blog do Randy Pausch este ensaio lindo escrito por Stephen Jay Gould, um professor de Harvard que lecionava Biologia Evolutiva e descbriu estar sofrendo de um câncer raro.
http://www.cs.cmu.edu/~pausch/news/medianNotMessage.html

Esta é minha inspiração para o dia de hoje.

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