September 2, 2008

Heróis Anônimos

As coisas aqui estão fervendo com a proximidade das eleições presidenciais e eu, como não poderia deixar de ser, fiquei vidrada acompanhando a Convenção Democrata durante toda a semana passada. Não pelas razões citadas pela mídia americana e ecoadas por todas as outras, mas porque eu ADORO um discurso! Gosto de ver oradores bons levantando multidões. Adoro ver a forma como eles organizam seus pensamentos e transmitem sua mensagem. Presto atenção no movimento das mãos e no olhar, no tom de voz e no ritmo da fala. Acho eletrizante.

Gosto muito da Michelle Obama como oradora. Posições políticas à parte, ela é clara ao expor suas idéias, sempre tem histórias pessoais que dão um toque humano ao seu discurso. Por mais articulada que ela seja, ela não aliena o povão, pois nunca deixa de repetir de uma forma ou de outra a mensagem "eu sou como vocês, lutei, me superei e hoje estou aqui. Vocês, meu povo, são capazes de fazer o mesmo."

Apesar do discurso da Mrs. Obama não ter desapontado, as palavras que mais me chamaram atenção não vieram do palanque e nem de nenhum candidato. A história que mais me tocou veio do filho de Joe Biden, o candidato a vice do Obama. Numa entrevista à NBC, se não me engano, a repórter mais uma vez fez referência à história triste da família Biden.

A primeira esposa de Joe e mãe de Beau, morreu num acidente de carro, às vésperas do Natal, quando saía com os três filhos para comprar uma árvore. Beau e seu irmão ficaram gravemente feridos. Sua mãe e sua irmã não sobreviveram. Joe não estava com a família pois naquele dia tinha ido a Washington visitar o novo gabinete. Ele tinha acabado de ganhar sua primeira eleição no Senado. Depois da tragédia, pensou em abandonar a carreira para se dedicar aos filhos, mas depois mudou de idéia, só que em vez de se mudar para Washington, como a maioria dos senadores, Joe ia e voltava todo dia de trem de Wilmington, Delaware, passando quase quatro horas em trânsito, mas chegando sempre a tempo de colocar os filhos na cama.

Como americano adora histórias de heroísmo, esta é um prato cheio e apesar do acidente ter acontecido nos anos setenta, os repórteres não se cansam de fazer menção a ele. Pois justo no dia da Convenção Nacional não seria diferente. Mas a resposta de Beau foi. Quando perguntado mais uma vez sobre a tragédia que tinha se abatido sobre sua família e como eles haviam superado, Beau respondeu mais ou menos assim: "A minha história é a história de muitas outras famílias americanas que perdem seus entes queridos a cada ano. Não tem nada de diferente ou especial, acontece com muita gente. Tive sorte de ter duas mulheres maravilhosas que pude chamar de mãe, a minha mãe biológica e a esposa do meu pai, que me criou."

Está aí alguém que consegue ver o copo meio cheio. Não posso imaginar pior tragédia do que perder a mãe e a irmã, mas ele encontrou forças e paz para continuar vivendo. E ele está mesmo certo, tem muita gente como ele vivendo por aí.

Parei para pensar e lembrei dos meus primos que perderam pai, mãe e irmão num terrível acidente de carro, também na década de setenta. Eu era muito pequena, mas me lembro de visitar a minha prima, que ficou bem machucada, na ABBR, no Rio. Não me lembro muito de detalhes, mas a imagem dela numa cadeira de rodas me ficou na memória. Lembro também que ela sorria muito. E isso já faz uns trinta anos.

Eu, que sempre tive um certo medo de dirigir, nunca entendi como a minha prima, a do acidente, que ficou um bom tempo fazendo fisioterapia para voltar a andar, conseguia dirigir para todo lado. (Por incrível que pareça, anos mais tarde ela sofreu outro acidente de carro, mas escapou novamente.) Um dia perguntei para ela. Ela riu e respondeu: "Medo de dirigir? Imagina! Para mim já ficou claro que não é assim que vou morrer!" E ela vive a vida dela, dirigindo e tomando as rédeas de seu próprio destino, sem medo. Os irmãos dela têm a mesma filosofia, são firmes e corajosos.

Depois de ouvir as palavras do Beau Biden entendi perfeitamente o que ele quis dizer. A parte triste da história da família dele faz parte da história da minha família também. E se ele é valente, meus primos, que perderam pai, mãe e irmão, são ainda mais... Só que eles não subiram em palanque, são heróis anônimos.

1 comment:

Roy Frenkiel said...

Onde estas que nao te conheco? hehe

Visite-me em casa, se quiser. Sempre estarei por aqui, de agora em diante.

Teja linkada ;-)

abraxao

RF