September 22, 2009

Hipocrisia & Celebridade no Hospital

Ontem soube que um famoso jogador de futebol americano faria uma visita aos pacientes jovens to hospital aqui da universidade. Ao que parece, ele teve casos de câncer na família e se sensibilizou com o trabalho do Ulman Fund. Até aí, tudo bem, achei a atitude do cara bacana. Muito legal ele arrumar tempo na agenda no meio da temporada. E fiquei pensando no meu amigo Todd, que apesar de não ser torcedor dos Ravens, iria adorar conhecer um jogador de futebol americano, esporte pelo qual ele era apaixonado.

Então hoje na hora do almoço, e Elizabeth me chama para encontrar com ela e conhecer Todd Heap, o tal jogador dos Ravens. Como estava a caminho do hospital para o almoço e um pouquinho curiosa, fui ao encontro dela. Ao chegar lá, me deparo com a seguinte cena: Elizabeth, na frente, de guia, Todd Heap a seguindo e atrás dele um multidão de, como diria meu pai, "papagaios de pirata". Fiquei passada! Onde estão estes parasitas quando precisamos de ajuda com os pacientes?! Vejo uma câmera de TV, alguns rostos conhecidos e vários estranhos. Não são funcionários do hospital, não sei quem são.

Correm todos para entrar no mesmo elevador, hipnotizados pelo ídolo do esporte. Ao me ver, Elizabeth sorri meio sem graça e me chama para entrar no elevador lotado com eles. Recuso imediatamente! Não tenho o menor interesse em fazer parte do circo. vejo ali que a visita não será exatamente como eu havia imaginado.

Sinto uma raiva enorme só de pensar na insensibilidade destas pessoas que caminham pelos corredores do hospital como se estivessem num parque de diversões, alheios ao sofrimento e à dor dos pacientes. Será que eles não entendem que apesar de seriamente doentes estas pessoas ainda tem dignidade e merecem ao menos um pouco de respeito?

Recebo outro torpedo da Elizabeth. "Estamos indo para a unidade de TMO. Você deveria vir conosco." Ao que respondo "Gente demais pode perturbar os pacientes." Decido ali mesmo que não quero ter nada a ver com a tal iniciativa.

É por estas e outras que sempre fui muito cética quando se trata de organizações de caridade. Por algum motivo, não sinto o engajamento esperado, não sinto esta autenticidade. Depois que fiquei doente e me curei, resolvi passar por cima deste meu sentimento de desconfiança (afinal sou escorpiana!) pelo que pensei ser uma causa maior. Na verdade, a causa é nobre, mas o modus operandi de algumas destas organizações deixa muito a desejar.

Olhar para uma ala de transplantados de medula como se fosse um passeio pelo zoológico é algo perturbador pra mim, me dá arrepios, me enoja. Me imagino ali, como paciente que fui, e penso na minha reação ao ver uma multidão de curiosos sem noção invadindo meu quarto e fingindo que se importam comigo. Uma mistura de desconforto e enjôo. Tudo para estar ao lado de um jogador de futebol -- muito bem intencionado, diga-se de passagem -- perseguindo seus 15 minutos (ou seriam segundos?) de fama.

Fiquei triste por perceber que pacientes foram usados como figurantes e cenário, numa visita que tinha tudo para ser bacana, mas que não passou de teatrinho infantil de quinta categoria. Todd Heap poderia mesmo ter visto o trabalho que é feito com os pacientes jovens, poderia ver que ainda há muito a ser desenvolvido e que ainda deixa a desejar. Mas no meio de tanta confusão, aposto que não viu nada disso.

Se estas mesmas pessoas que hoje escoltam Todd Heap em sua visita ao hospital, estivessem presentes pelo menos uma vez por semana visitando os pacientes, muitos deles não se sentiriam sós em seus momentos finais. Não posso deixar também de me perguntar quantos dos que estavam naquele elevador irão doar suas medulas este sábado...

2 comments:

Roy Frenkiel said...

Se pensavamos que a realidade era apenas lidar com doencas e a propria mortalidade, we must think again. A realidade eh, PRINCIPALMENTE, isso ai.

bjx

RF

Dani said...

Adorei te ver por aqui de novo, Roy!
Gosto muito desta sua veia de filosofo... :)
Bjs