February 18, 2009

Happy ou Sad Hour?

Hoje é dia do happy hour promovido pela Ulman Foundation, aqui em Maryland. O Blake insiste em chamar o evento de "sad hour" porque só tem histórias tristes, pelo menos aos olhos dele.

É verdade que esta é a primeira impressão sim, pois todos que estão ali certamente preferiam não estar. Não pela companhia, que é sempre agradável, ou pelo bate papo, sempre animado, mas pelo motivo primordial que faz com que todas nós tenhamos algo em comum: a doença, aquela doença. Ao olharmos umas para as outras entendemos que aquilo é real, que não foi só um sonho ruim do qual podemos acordar a qualquer momento. Não é algo que aconteceu às sombras e que pode ser varrido para baixo do tapete. Não, a doença é ou foi uma experiência real.

A partir do momento que você toma a decisão de tornar a doença pública ela passa a não ser mais só sua. Ela é da sua família, dos seus amigos e de todos que se importam com você. A partir do momento que você passa a militar e a lutar por mais verbas para a pesquisa, por maior acesso aos tratamentos, por uma melhor qualidade de vida para os pacientes, você sai do seu domínio particular e passa a figurar no domínio público. A escolha está feita, conscientemente ou não.

Não dá mais para esconder a doença de ninguém, não pode mais reclamar quando olham para você e dizem "nossa, nem parece que você teve câncer. Você parece tão saudável." Tem que engolir e sorrir. Pode até responder "Pareço não, sou saudável. Assim como você." Mas é só. Ao optar por viver sua experiência em público você deixa de ter alguns direitos, entre eles o da total privacidade. Também perde o pseudo-privilégio de 'ignorar' a doença de vez em quando, ou de às vezes achar que aquilo tudo não aconteceu com você -- deve ter sido com alguém muito próximo, pois a história é completamente surreal. Não existe mais a menor possibilidade de negação.

Ao aceitar encontrar ( e por que não 'encarar'?) estas pessoas que tem em comum aquilo que você mais teme ou abomina, você invariavelmente se torna uma delas. É difícil ouvir a história de uma mulher praticamente da sua idade que tem a doença em estágio avançado e cujas alternativas de cura são cada vez mais escassas. É difícil não pensar que poderia ser você ali e aceitar que não há para ela como não haveria para você nada a fazer. Há de se ter fé. Há de se lutar. Mas fora isto, não nos resta muito a não ser aceitar a nossa fragilidade e consequentemente a nossa mortalidade. Desafio cruel para alguém tão jovem.

Às vezes penso que o Blake tem razão e a happy/sad hour me consome um pouco, mas é um esforço válido, principalmente para quem como eu é apaixonada por gente e pelas nuances do ser humano. No início, me perguntava por que estas coisas tão difíceis aconteciam com pessoas tão fantásticas. Hoje penso que não são as pessoas que são fantásticas, mas provavelmente as circustâncias nas quais elas se encontram. Estas mesmas circunstâncias fazem com que a imensa maioria dos seres humanos mostre o que tem de melhor.

Para ilustrar minha teoria, uso a frase que nosso vice-presidente José Alencar disse ao sair do hospital ontem, depois de mais uma cirurgia para remoção de outro tumor no abdomem. José Alencar enfrenta a doença desde 1997 e continua trabalhando e vivendo. Quando perguntado como tinha tanta fé e tanta coragem para enfrentar o tratamento, ele disse: "Isso pode ser um equívoco. Onde está a coragem de um homem que não tinha outra alternativa? Não tinha outra opção. Era ou vai ou vai."

Se o vice-presidente é uma pessoa extraordinária eu não sei, mas sua lucidez e suas palavras são.

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