Uns dizem que ele é um herói, outros dizem que o cara é um tremendo canastrão, o que no final das contas prova que ele é antes de tudo um ser humano, passível de erros.
Hoje sem querer, esbarrei com esta tradução de um trecho do livro dele e parei para ler. É incrível como pessoas completamente diferentes recebem uma notícia parecida... É impressionante perceber que o enredo é sempre o mesmo. Muitos dos pensamentos que passaram pela cabeça de Lance vivem na minha memória até hoje.
O livro não é nada novo, já até tinha lido esta passagem, mas por algum motivo hoje ela se tornou mais especial para mim:
"Câncer é assim. É como ser derrubado na estrada por um caminhão. E tenho as cicatrizes para provar. Há um corte enrugado na parte alta do meu tórax, um pouco abaixo do coração, que foi por onde o catéter foi introduzido. Um outro corte cirúrgico começa no lado direito da minha virilha, adentrando a parte superior da coxa, de onde extraíram meu testículo. Mas os verdadeiros prêmios são duas meias-luas profundas no meu crânio, como se um cavalo me tivesse dado dois coices na cabeça. São restos de uma cirurgia no cérebro.
Quando eu tinha 25 anos, tive câncer testicular e quase morri. Deram-me menos de 40% de chances de sobreviver e, francamente, alguns dos meus médicos estavam sendo bonzinhos quando deram essa probabilidade. Morte não é exatamente uma conversa de coquetel, sei, e tampouco é o câncer, a cirurgia cerebral ou coisas abaixo da cintura. Mas não estou aqui para falar sobre coisas bonitinhas. Quero contar a verdade. Tenho certeza de que você gostará de saber como Lance Armstrong tornou-se um respeitado cidadão americano e fonte de inspiração para todos nós, como ele venceu o Tour de France, corrida de estrada de 2290 milhas, que é considerado o evento esportivo mais cansativo da face da Terra. Você quer ouvir sobre fé e mistério, meu retorno milagroso e como me juntei a altas personalidades, como Greg LeMond e Miguel Indurain, no livro dos recordes. Você quer saber sobre a subida lírica através dos Alpes, minha conquista heróica dos Pirineus e todo o sentimento sobre isso. Mas o Tour é a última parte da história.
Algo disso não é fácil de se falar ou confortável de se ouvir. Peço-lhe, de início, que ponha de lado suas idéias sobre heróis e milagres porque não sou material para um livro de histórias. Isto não é Disneylândia, ou Hollywood.
Darei um exemplo: li que voei por sobre as colinas e montanhas da França. O problema é que você não voa sobre uma colina. Você luta lenta e dolorosamente na subida da montanha e talvez, se trabalhar muito duro, conquista seu cume primeiro que todo mundo.
Câncer é assim também. Pessoas boas e fortes contraem câncer, fazem todas as coisas certas para derrotá-lo e ainda assim morrem. Essa é a verdade essencial que se aprende. Pessoas morrem. E depois que você aprende isso, todas as outras coisas tornam-se irrelevantes. Elas simplesmente parecem pequeninas.
Não sei porque ainda estou vivo. Posso apenas supor. Tenho uma constituição física rígida e minha profissão me ensinou como competir com baixas probabilidades e grandes obstáculos. Gosto de treinar duro e correr com raça. Isso ajudou. Foi um bom começo, mas certamente não foi o fator determinante. Não ajudarei em nada se acreditar que minha sobrevivência foi apenas uma questão de sorte.
Quando eu estava com 16 anos, fui convidado a fazer um teste num lugar em Dallas chamado "Cooper Clinic", um prestigiado laboratório de pesquisas e o local de nascimento da revolução dos exercícios aeróbicos. Um médico lá mediu meu nível máximo de VO2, que é uma avaliação de quanto oxigênio você pode reter e usar. O médico disse que os meus resultados eram os mais altos que eles já haviam encontrado. Também, eu produzia menos ácido lático que a maioria das pessoas. Ácido lático é um produto químico que seu corpo gera quando lhe falta ar e quando está fatigado. É isso que faz seus pulmões queimarem e doer as pernas.
Basicamente, posso suportar mais cansaço físico que a maioria das pessoas e não fico tão cansado quando estou fazendo isso. Então percebi que isso poderia me ajudar a ganhar a vida. Tive sorte. Nasci com uma capacidade de respirar acima da média. Mas ainda assim, eu estaria sujeito a um nevoeiro de doença.
Minha doença estava me abatendo, revelando-se de forma grave e forçou-me a analisar a vida com uma visão implacável. Há alguns episódios vergonhosos nisso: exemplos de avareza, tarefas inacabadas, fraquezas e lamentações. Tive que me perguntar: "Seu eu viver, quem pretenderei ser?" Descobri que eu tinha muito que crescer como um homem.
Não vou te iludir. Existem dois Lance Armstrongs, o do pré-câncer e o posterior. A pergunta favorita de todos é: "Como o câncer te mudou?" A questão correta é: como ele não me mudaria? Deixei minha casa em 02 de outubro de 1996 como uma pessoa e quando voltei era outra. Eu era um atleta de nível internacional com uma mansão à margem de um rio, chaves para o Porsche e com uma fortuna no banco que eu havia feito. Eu era um dos maiores corredores do mundo e minha carreira estava se movendo em um perfeito arco de sucesso. Retornei uma pessoa diferente, literalmente. De um modo, o velho de mim morreu e eu tinha ganhado uma segunda vida. Até o meu corpo é diferente porque durante a quimioterapia perdi todos os músculos que havia conseguido e, quando os recuperei, não vieram do mesmo modo.
A verdade é que o câncer foi a melhor coisa que já aconteceu comigo. Não sei porque contraí a doença, mas ela fez milagres por mim e eu não fugiria dela. Por que eu iria querer mudar o evento mais importante e construtivo da minha vida?
As pessoas morrem. Essa verdade é tão desanimadora que às vezes não suporto articular sobre isso. Por que devemos seguir em frente? - você deve perguntar. Por que simplesmente não paramos e deitamos onde estamos? Há uma outra verdade também. São verdades iguais, porém contrapostas. As pessoas vivem, e das maneiras mais extraordinárias. Quando eu estava doente, vi mais beleza, triunfo e honestidade em um único dia, do que em qualquer corrida. E aqueles momentos eram humanos, não se tratava de milagre. Conheci um cara com uma roupa gasta e suada que se tornou um brilhante cirurgião. Fiquei amigo de uma enfermeira apressada e ocupada chamada LaTrice, que me deu tanta atenção que aquilo só podia ser resultado da mais profunda simpatia e afeição. Vi crianças sem cílios, sem sobrancelhas, com os cabelos queimados pela quimioterapia e que lutavam com corações de Indurains.
Ainda não entendo completamente."
Tradução livre de Fábio Ribeiro, Sorocaba SP.
Texto original em inglês disponível gratuitamente neste link
Página copiada do site
Página do Lance Armstrong
2 comments:
Obrigada por postar, Dani! Lance Armstrong pra mim é muito herói! =) beijos!
Ele e um grande exemplo (assim como voce) de superacao do medo, do desconhecido e dos danos pessoais que uma doenca como essa pode trazer. Ele tambem se superou tornando-se uma pessoa diferente. Acredito que a fragilidade que se percebe ao se confrontar com o cancer deve mudar demais a maneira como a pessoa ve todos os aspectos da vida. E ao passar por um obstaculo como esse, acredito que se adquire uma maneira um tanto peculiar de avaliar a forma de se seguir em frente.
Passa la no meu blog, deixei uma homenagem (um selinho) para as pessoas que me viciaram em blogs e vc esta entre elas!
Bjs!
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