Esta é uma das coisas que a gente mais faz quando do nada é abatido por uma tempestade em pleno vôo. Sim, quando só estava preocupada em viver a minha vida, um dia de cada vez, e de repente chego à dura conclusão de que o dia de amanhã não é tão certo assim. Parece coisa de filme, mas não é. De uma hora para outra muda tudo e não há outra saída a não ser seguir em frente. Até gostaria de ter outras opções para escolher, mas a verdade é bem diferente.
Depois de ouvir um diagnóstico assustador, tudo que queria fazer era ir dormir e rezar para que tudo não tenha passado de um pesadelo terrível. Mas quando acordei no dia seguinte e tudo estava no mesmo lugar, inclusive o bandido parasita que teimava em se alojar na minha barriga, bateu um desânimo terrível, mas ao mesmo tempo uma grande vontade de mudar o meu próprio destino.
E foi justo aí que pensei em Deus. Onde ele está numa hora destas? Será que ele está vendo todo o meu sofrimento? Será que ele não vai se compadecer? Logo eu, que tenho feito tudo que ele mandou, por que este castigo? Por que outra vez? Como faço para sair daqui? Será que vou conseguir sair daqui? São tantas perguntas, tantos questionamentos.
É verdade que nos últimos cinco anos fiquei muito mais próxima de Deus e de mim mesma. Nos piores momentos da minha vida, às vezes sentia uma paz inexplicável, uma mão carinhosa que me indicava o caminho a seguir e no meio do meu desespero sentia uma energia que me trazia de volta a tranquilidade. Sempre entendi que só poderia ser a presença de Deus. Durante aqueles últimos dias de 2007 e no início deste ano, estava tão perdida que sequer sabia o que pedir a Deus, então só implorava que ele aumentasse a minha fé e me desse coragem: aumentasse a minha fé que por vezes estava claudicante, e me desse coragem para enfrentar o meu destino, que me parecia assustandor. E ele me ouviu, mais uma vez. Passei pela prova de fogo e aqui estou contando a história.
Li os comentários anteriores da Fê França e da Andréa, amigas virtuais que estão sempre me dando injeções de ânimo e me fazendo seguir em frente, e fiquei pensando no que foi dito. Tenho uma fé ENORME em Deus e acho que estamos todos aqui na Terra não para sofrer, mas para aprender. Às vezes penso que tenho mais que aprender do que muita gente...Mas c'ést la vie.
A minha fé em Deus é inabalável, mas, por incrível que pareça, às vezes a fé das pessoas me incomoda, pois as deixa inertes. Óbvio que eu acredito em milagres divinos que acontecem todo o dia. Eu sou um deles! Mas acho que Deus deve ficar muito chateado de ter que fazer todo o trabalho sozinho. Se foi ele mesmo que nos deu o livre arbítrio, temos que usá-lo. Vamos rezar sim, mas vamos encarar a doença de frente! Vamos ter muita fé, mas também procurar os melhores médicos e tratamentos que possam prolongar nossa vida. Vamos orar contritos, mas também nos tornar senhores do nosso destino, pesquisando a doença, as alternativas e questionando os médicos. Sim, Deus é o regente, mas nós somos a orquestra e temos que fazer nosso trabalho! Sempre fui inconformada, e com tudo que tenho passado tenho mudado um pouco meus conceitos, mas uma coisa permanece a mesma -- sempre fui de arregaçar as mangas e por as mãos à obra, e numa situação destas não haveria de ser diferente. Aceito, mas custo a me conformar. Aceito a gravidade da doença, mas não me conformo com a sentença de morte. Não vou me conformar nunca. E graças a Deus existem outros inconformados por aí. Inconformados que buscam a cura do câncer, da aids e de tantas outras pestes do mundo moderno. Agradeço a Deus toda noite por estes espíritos inquietos.
Quando a Carla, minha amiga e companheira de batalha e ex-colega de trabalho, foi me visitar em casa depois da cirurgia, ela me disse que entendia a doença como um ritual de purificação. (Engraçado é que outra amiga messiânica tinha me dito a mesma coisa, que a doença servia para expurgar o que há de ruim em nós). Não é muito fácil encarar uma doença destas, aliás doença nenhuma, como algo positivo, ainda mais quando se está no meio da luta. Mas sempre encarei a minha experiência como aprendizado, pois descobri muitas coisas sobre mim que provavelmente ficariam esquecidas ou enterradas nas profundezas da minha alma se eu tivesse sido contemplada com uma vida mais ordinária. Então talvez o bandido (não quero mais falar em tumor, ficou chato!) tenha sido, como se diz aqui, "a blessing in disguise." Mas agora já chega, estou confiante que posso completar o resto da lição sozinha!
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February 28, 2008
February 27, 2008
Morbidez
Ontem, depois de falar com a secretária do Dr. Machael Choti, fui olhar as minhas coisas e separar o material para ser enviado por fax ao médico hoje. Imaginem vocês que tenho mais de cinco anos de história médica deste maldito tumor: exames de sangue, que na maior parte das vezes nada acusam, imagens que mascaram o bandido na minha barriga, relatórios médicos superdetalhados, outras imagens onde o bandido mostra a cara, o próprio bandido em pedacinhos guardado em potinhos de plástico e mais microfatias do bandido conservadas em parafina. Material é o que não falta. Mas pouco pode ser enviado por fax!
Depois de olhar tudo cuidadosamente, cheguei à conclusão que nesta parte inicial deveria me limitar a mandar o relatório da segunda cirurgia, que já está em inglês, e o resultado da última biópsia. Quero que o médico de Hopkins veja todo o resto, mas acho que vou me limitar a isso para não assustá-lo.
Se o relatório médico já está escrito em inglês e foi feito na minha frente, o laudo da biópsia está todo em português e para dizer a verdade só fui entendê-lo realmente ontem à noite, pois a linguagem médica pode ser mais complicada do que qualquer língua estrangeira.
Foi ontem que entendi a alegria dos médicos quando viram o termo "ausênsia de neoplasia..." várias vezes no laudo. Neoplasia quer dizer proliferação anormal das células num órgão ou tecido que forma o neoplasma, também conhecido como TUMOR. Então o que o laudo dizia, para alegria geral da nação, é que nos linfonodos não existia formação tumoral, ou seja, NÃO HOUVE METÁSTESE. Ufa, excelente notícia!
Pesquisei muito mais ainda nestes sites, pois palavras como "linfonodos coledococianos", "parênquima pardacento", "tabernáculas ou maciços dispostos em traves fibrosas" realmente não fazem parte do vocabulário de alguém leigo como eu. Então eu ia aproximando a palavra do idioma inglês, colocando no Google e vendo se a fonte em questão era confiável. (Aprendi este truque quando tive que fazer uma tradução dificílima de uma Due Diligence que a Mitsui fez na Vale!)
Mas estas pesquisas em sites médicos são extremamente assustadoras e traduzir a própria biópsia tem um grau de morbidez enorme. Depois de visitar trocentos sites cada um mais horripilante que o outro, lembrei exatamente o motivo que me faz ter horror a este tipo de site. Cada vez que leio sobre o tal do HCC fibrolamelar me sinto um ET.
Num dos textos que li ontem, o autor estava bastante otimista, pois nos casos de fibrolamelar há pacientes que chegaram a ter uma sobrevida (êta palavrinha ridícula!!!) de até 14 anos!!! Entenderam bem: 14 ANOS!!! E isso é motivo para comemorar... Pena que não posso estourar uma taça de champanhe... A pergunta que não quer calar é se devo contar a partir dos meus 28 ou 34 anos. Se for a partir dos 34, pelo menos chego aos meus 48 anos, um pouco mais da metada da expectativa de vida em países desenvolvidos como o Japão. Se for a partir dos 28, já queimei mais de um terço do tempo que me resta. Mas em qualquer uma das hipóteses, tempo é um luxo que não tenho, então não vou perdê-lo com previsões bobas!
Óbvio que fico assustada toda vez que leio estas coisas. Se o ser humano não suporta a idéia da morte, imagina saber que tem um "prazo de validade." Me faz lembrar aquele filme do Brad Pitt, "Meet Joe Black", que no Brasil acho que recebeu o título de "Encontro Marcado." Por mais lindo que o Brad Pitt possa ser, se a morte tiver a cara dele, me contento ficando a quilômetros de distância.
Passado o susto inicial -- vou ter que aprender a ficar imune a este tipo de coisa! -- continuei lendo os artigos sobre o HCC e meu caso é muito, muito estranho. De acordo com todos os médicos, o tumor é muito agressivo (daí o alto índice de mortalidade) e a taxa de reincidência varia entre 42 e 100%, principalmente nos primeiros 12 ou 18 meses, então juntem as peças comigo e tentem me explicar.
1. Na hipótese do tumor ser vestígio da outra cirurgia -- Se ele é tão agressivo, como sobrevivi com ele na minha barriga, praticamente imperceptível e assintomático, por mais de cinco anos?
2. Na hipótese de ser novo -- Se as recidivas ocorrem até os primeiros 18 meses, como este troço veio do nada depois de mais de cinco anos?
Cada vez mais me convenço que NADA, absolutamente NADA, na minha vida pode ser normal, nem mesmo o diagnóstico de uma doença covarde como esta! O que neste caso é muito bom, pois estou aqui vivinha e de bem com a vida. Pensando bem acho que o primeiro passo para minha felicidade é entender que o meu maior pedido foi atendido: sempre tive horror das coisas "ordinárias" e ansiei por ser única, diferente.
O resultado está aí: uma caminhada sinuosa, acidentada, mas muito rica e só minha. Como gosto tanto desta caminhada, por mais que às vezes ela me enlouqueça, vou continuar seguindo a estrada menos viajada, pois como disse o poeta, isto fez toda a diferença!
Depois de olhar tudo cuidadosamente, cheguei à conclusão que nesta parte inicial deveria me limitar a mandar o relatório da segunda cirurgia, que já está em inglês, e o resultado da última biópsia. Quero que o médico de Hopkins veja todo o resto, mas acho que vou me limitar a isso para não assustá-lo.
Se o relatório médico já está escrito em inglês e foi feito na minha frente, o laudo da biópsia está todo em português e para dizer a verdade só fui entendê-lo realmente ontem à noite, pois a linguagem médica pode ser mais complicada do que qualquer língua estrangeira.
Foi ontem que entendi a alegria dos médicos quando viram o termo "ausênsia de neoplasia..." várias vezes no laudo. Neoplasia quer dizer proliferação anormal das células num órgão ou tecido que forma o neoplasma, também conhecido como TUMOR. Então o que o laudo dizia, para alegria geral da nação, é que nos linfonodos não existia formação tumoral, ou seja, NÃO HOUVE METÁSTESE. Ufa, excelente notícia!
Pesquisei muito mais ainda nestes sites, pois palavras como "linfonodos coledococianos", "parênquima pardacento", "tabernáculas ou maciços dispostos em traves fibrosas" realmente não fazem parte do vocabulário de alguém leigo como eu. Então eu ia aproximando a palavra do idioma inglês, colocando no Google e vendo se a fonte em questão era confiável. (Aprendi este truque quando tive que fazer uma tradução dificílima de uma Due Diligence que a Mitsui fez na Vale!)
Mas estas pesquisas em sites médicos são extremamente assustadoras e traduzir a própria biópsia tem um grau de morbidez enorme. Depois de visitar trocentos sites cada um mais horripilante que o outro, lembrei exatamente o motivo que me faz ter horror a este tipo de site. Cada vez que leio sobre o tal do HCC fibrolamelar me sinto um ET.
Num dos textos que li ontem, o autor estava bastante otimista, pois nos casos de fibrolamelar há pacientes que chegaram a ter uma sobrevida (êta palavrinha ridícula!!!) de até 14 anos!!! Entenderam bem: 14 ANOS!!! E isso é motivo para comemorar... Pena que não posso estourar uma taça de champanhe... A pergunta que não quer calar é se devo contar a partir dos meus 28 ou 34 anos. Se for a partir dos 34, pelo menos chego aos meus 48 anos, um pouco mais da metada da expectativa de vida em países desenvolvidos como o Japão. Se for a partir dos 28, já queimei mais de um terço do tempo que me resta. Mas em qualquer uma das hipóteses, tempo é um luxo que não tenho, então não vou perdê-lo com previsões bobas!
Óbvio que fico assustada toda vez que leio estas coisas. Se o ser humano não suporta a idéia da morte, imagina saber que tem um "prazo de validade." Me faz lembrar aquele filme do Brad Pitt, "Meet Joe Black", que no Brasil acho que recebeu o título de "Encontro Marcado." Por mais lindo que o Brad Pitt possa ser, se a morte tiver a cara dele, me contento ficando a quilômetros de distância.
Passado o susto inicial -- vou ter que aprender a ficar imune a este tipo de coisa! -- continuei lendo os artigos sobre o HCC e meu caso é muito, muito estranho. De acordo com todos os médicos, o tumor é muito agressivo (daí o alto índice de mortalidade) e a taxa de reincidência varia entre 42 e 100%, principalmente nos primeiros 12 ou 18 meses, então juntem as peças comigo e tentem me explicar.
1. Na hipótese do tumor ser vestígio da outra cirurgia -- Se ele é tão agressivo, como sobrevivi com ele na minha barriga, praticamente imperceptível e assintomático, por mais de cinco anos?
2. Na hipótese de ser novo -- Se as recidivas ocorrem até os primeiros 18 meses, como este troço veio do nada depois de mais de cinco anos?
Cada vez mais me convenço que NADA, absolutamente NADA, na minha vida pode ser normal, nem mesmo o diagnóstico de uma doença covarde como esta! O que neste caso é muito bom, pois estou aqui vivinha e de bem com a vida. Pensando bem acho que o primeiro passo para minha felicidade é entender que o meu maior pedido foi atendido: sempre tive horror das coisas "ordinárias" e ansiei por ser única, diferente.
O resultado está aí: uma caminhada sinuosa, acidentada, mas muito rica e só minha. Como gosto tanto desta caminhada, por mais que às vezes ela me enlouqueça, vou continuar seguindo a estrada menos viajada, pois como disse o poeta, isto fez toda a diferença!
February 26, 2008
Burocracia...aqui também tem!!!
Depois de uma semana de jet-setter em Nova York, chegou a hora de colocar as coisas em ordem aqui em Suburbia, USA.
Ontem fui a mais uma entrevista e por incrível que pareça, o pessoal gostou da minha experiência internacional. Agora vamos ver no que vai dar. O lugar é bem bacana e o escritório lindíssimo e supermoderno, muito claro, com móveis em linhas retas e chão de porcelanato, coisa que a gente não vê quase por aqui!
Finalmente hoje consegui contato com o consultório do Dr. Michael Choti, o cirurgião oncológico especializado em fígado que me foi indicado pelos médicos do Brasil.
Falei com a secretária, óbvio, pois neste país é mais fácil uma audiência com o Papa do que uma conversa com um médico. Expliquei a ela o meu caso e ela me instruiu a mandar todo o material por fax!!! Então disse a ela que fora o relatório do médico, que tiha sido escrito em inglês, tinha muito pouca coisa que poderia ser passada por fax. As minhas imagens eram imensas e além delas tinha trazido "a peça", ou seja o tumor. Ela disse que poderia mandar os slides por fax, então expliquei melhor: "Não, minha senhora, não se trata de fotografia, eu realmente tenho o meu tumor aqui comigo! Trouxe cada partezinha dele dissecada e conservada em parafina. Trouxe tudo na minha mala de mão e gostaria que o Dr. Choti desse uma olhadinha nelas e depois me desse sua opinião." Acho que foi então que ela viu que eu não estava brincando. Perguntou meu nome e disse que iria aguardar as minhas informações e depois então alguém entraria em contato comigo.
Qualquer semelhança com o atendimento no SUS não é mera coincidência! O jeito SUS de ser aqui é bem high-tech. O sujeito tem que ter todos os exames e imagens à mão, mas antes de tudo tem que ter um fax, pois contato face a face não existe, pelo menos não nesta fase. A fila, a agonia da espera, a ansiedade, tudo isso é igual. Mas se no Brasil o povo faz fila na porta do hospital, aqui até a espera é virtual. A gente manda o máximo de informação possível via fax e depois fica esperando a secretária do médico ligar para saber se o dito cujo vai poder atender a gente. Será que meu caso é grave o suficiente? Será que sou digna da atenção do medalhão? Será que a secretária dele vai me ligar? Pareço adolescente esperando a ligação do carinha que encontrei na festa... Vivo o meu limbo, mas desta vez é muito mais grave. Se o carinha não ligar vou ter que arrumar outro médico pra cuidar de mim, e convenhamos que cirurgiões-oncológicos especializados em fígado não aparecem por aí às pencas.
Como aqui neste país tudo é uma competição e apresentação é o que mais importa, vou escrever a minha cartinha pro Baú da Felicidade do Dr. Choti e torcer para ele se emocionar com a minha história o suficiente para querer me ver. Queria pelo menos ter a chance de levar meus zilhões de exames e obviamente os pedacinhos do meu tumor, que ainda estão guardados no meu quarto a espera do verdicto final.
Desejem-me sorte. Pois é, this is the American way of life...
Ontem fui a mais uma entrevista e por incrível que pareça, o pessoal gostou da minha experiência internacional. Agora vamos ver no que vai dar. O lugar é bem bacana e o escritório lindíssimo e supermoderno, muito claro, com móveis em linhas retas e chão de porcelanato, coisa que a gente não vê quase por aqui!
Finalmente hoje consegui contato com o consultório do Dr. Michael Choti, o cirurgião oncológico especializado em fígado que me foi indicado pelos médicos do Brasil.
Falei com a secretária, óbvio, pois neste país é mais fácil uma audiência com o Papa do que uma conversa com um médico. Expliquei a ela o meu caso e ela me instruiu a mandar todo o material por fax!!! Então disse a ela que fora o relatório do médico, que tiha sido escrito em inglês, tinha muito pouca coisa que poderia ser passada por fax. As minhas imagens eram imensas e além delas tinha trazido "a peça", ou seja o tumor. Ela disse que poderia mandar os slides por fax, então expliquei melhor: "Não, minha senhora, não se trata de fotografia, eu realmente tenho o meu tumor aqui comigo! Trouxe cada partezinha dele dissecada e conservada em parafina. Trouxe tudo na minha mala de mão e gostaria que o Dr. Choti desse uma olhadinha nelas e depois me desse sua opinião." Acho que foi então que ela viu que eu não estava brincando. Perguntou meu nome e disse que iria aguardar as minhas informações e depois então alguém entraria em contato comigo.
Qualquer semelhança com o atendimento no SUS não é mera coincidência! O jeito SUS de ser aqui é bem high-tech. O sujeito tem que ter todos os exames e imagens à mão, mas antes de tudo tem que ter um fax, pois contato face a face não existe, pelo menos não nesta fase. A fila, a agonia da espera, a ansiedade, tudo isso é igual. Mas se no Brasil o povo faz fila na porta do hospital, aqui até a espera é virtual. A gente manda o máximo de informação possível via fax e depois fica esperando a secretária do médico ligar para saber se o dito cujo vai poder atender a gente. Será que meu caso é grave o suficiente? Será que sou digna da atenção do medalhão? Será que a secretária dele vai me ligar? Pareço adolescente esperando a ligação do carinha que encontrei na festa... Vivo o meu limbo, mas desta vez é muito mais grave. Se o carinha não ligar vou ter que arrumar outro médico pra cuidar de mim, e convenhamos que cirurgiões-oncológicos especializados em fígado não aparecem por aí às pencas.
Como aqui neste país tudo é uma competição e apresentação é o que mais importa, vou escrever a minha cartinha pro Baú da Felicidade do Dr. Choti e torcer para ele se emocionar com a minha história o suficiente para querer me ver. Queria pelo menos ter a chance de levar meus zilhões de exames e obviamente os pedacinhos do meu tumor, que ainda estão guardados no meu quarto a espera do verdicto final.
Desejem-me sorte. Pois é, this is the American way of life...
February 3, 2008
Mais Surpresas
Ontem fui dar uma olhada na caixinha do correio aqui do prédio. Como não moro mais aqui, meus pais normalmente abrem a caixinha de vez em quando só para pegar uma conta ou outra, mas como estou aqui este tempo, ontem resolvi olhar.
Achei um envelope cujo destinatário era "Dani Baron". Imediatamente vi que não podia ser de nenhum dos meus amigos aqui que por força do hábito só me chamam de "Dani Duran". O carimbo do correio não deixou dúvida: "Baltimore, MD" Abri o cartão lindo que dizia "Wishing you well again" e não reconheci a assinatura: "Bob Balassone". Quem seria esta pessoa tão gentil cujo nome eu sequer havia reconhecido.
E conversando com o Blake, lembrei-me que uma única vez encontrei alguns colegas de trabalho dele para um almoço. Bob era de um deles! Inacreditável que alguém que só tinha me visto uma vez se importava comigo o bastante para descobrir meu endereço aqui no Brasil e me mandar um cartão e "get well wishes." Quando eu digo que tem muita gente boa neste mundo....
É por estas e outras que continuo otimista. Enquanto houver gente bacana e solidária por aí, vou lutando para ficar aqui e fico feliz feliz.
E por falar em felicidade, hoje por acaso achei o laudo da biópsia da primeira cirurgia e confirmei a informação de que havia dois tumores em 2002: um pequeno, de cerca de 2 cm de diâmetro e outro imenso de 18 cm. O pequeno era mesmo adenoma (tumor benigno) e o maior era hepatocarcinoma (câncer). A boa notícia, que confirma o que o Dr. Joaquim vem dizendo, é que o tumor menor e portanto benigno foi retirado a 0,01 mm da linha de resecção, ou seja, muito próximo do corte, sendo assim é muito provável que alguma parte (minúscula) dele tenha ficado e crescido nestes últimos cinco anos e se transformado neste tumor de 7 cm que acabei de retirar.
Vou juntar estes laudo ao resto da documentação e mostrar aos médicos em Hopkins. Acho que se trata de uma informação importante...e que pode jogar muito a meu favor. Como diz a Claudia, vou manter os dedinhos cruzados mais do que nunca.
Achei um envelope cujo destinatário era "Dani Baron". Imediatamente vi que não podia ser de nenhum dos meus amigos aqui que por força do hábito só me chamam de "Dani Duran". O carimbo do correio não deixou dúvida: "Baltimore, MD" Abri o cartão lindo que dizia "Wishing you well again" e não reconheci a assinatura: "Bob Balassone". Quem seria esta pessoa tão gentil cujo nome eu sequer havia reconhecido.
E conversando com o Blake, lembrei-me que uma única vez encontrei alguns colegas de trabalho dele para um almoço. Bob era de um deles! Inacreditável que alguém que só tinha me visto uma vez se importava comigo o bastante para descobrir meu endereço aqui no Brasil e me mandar um cartão e "get well wishes." Quando eu digo que tem muita gente boa neste mundo....
É por estas e outras que continuo otimista. Enquanto houver gente bacana e solidária por aí, vou lutando para ficar aqui e fico feliz feliz.
E por falar em felicidade, hoje por acaso achei o laudo da biópsia da primeira cirurgia e confirmei a informação de que havia dois tumores em 2002: um pequeno, de cerca de 2 cm de diâmetro e outro imenso de 18 cm. O pequeno era mesmo adenoma (tumor benigno) e o maior era hepatocarcinoma (câncer). A boa notícia, que confirma o que o Dr. Joaquim vem dizendo, é que o tumor menor e portanto benigno foi retirado a 0,01 mm da linha de resecção, ou seja, muito próximo do corte, sendo assim é muito provável que alguma parte (minúscula) dele tenha ficado e crescido nestes últimos cinco anos e se transformado neste tumor de 7 cm que acabei de retirar.
Vou juntar estes laudo ao resto da documentação e mostrar aos médicos em Hopkins. Acho que se trata de uma informação importante...e que pode jogar muito a meu favor. Como diz a Claudia, vou manter os dedinhos cruzados mais do que nunca.
January 22, 2008
Os Próximos Cinco Anos
Acabo ver na TV que o caso do jogador de basquete Nenê Hilário teve mais uma reviravolta. O tumor que seria benigno, de acordo com um médico brasileiro entrevistado pela revista Época, na verdade era maligno. Grande surpresa para a maioria das pessoas. Não para mim, que já vivi o mesmo drama não uma, mas duas vezes.
Não tenho os detalhes, mas acho que posso imaginar como Nenê se sente. Aliviado por ter detectado o problema em estágio inicial, pois o tumor ainda não tinha se espalhado para outros órgãos, mas ao mesmo tempo preocupado com seu futuro. Apavorado talvez. Pela primeira vez se depara com a possibilidade real da morte, aos 25 anos.
O fato é que no caso de um tumor benigno tudo é muito simples: depois da cirurgia o problema está solucionado e o paciente volta a uma vida normal. Já no caso de um tumor maligno, mesmo que encapsulado, a coisa já muda de figura, pois simplesmente não há certezas. É nesta hora que os médicos tornam-se reticentes, que os laudos ficam mais complexos e a vida mais confusa. Aliás é justo nesta hora que a gente passa a não ter mais vida e sim sobrevida.
Imagino que o Nenê esteja agora tentando elaborar tudo isto. Se há um mês sua única preocupação era uma contusão nas quadras ou uma cesta perdida, agora ele tem muito mais com que se preocupar. Não tenho dúvidas que o Nenê já é uma outra pessoa depois de passar por isto tudo em tão pouco tempo. Mas se o tumor fosse benigno, ele seguramente poderia varrer tudo para baixo do tapete e continuar vivendo a vidinha de sempre. Tudo não passaria de um pesadelo que teria ficado parar trás. Mas agora, depois de um laudo diferente e definitivo, ele já não tem mais esta escolha. Não dá para enterrar uma experiência destas quando se tem que enfrentá-la a cada três meses, quando se volta ao local do crime rezando para não encontrar novas evidências. Não dá para seguir levando a mesma vidinha de sempre quando ela não se chama mais vida, e sim sobrevida, e você tem que viver em liberdade vigiada pelos próximos cinco anos. Não dá para fazer simples planos sem pelo menos uma vez questionar se vamos durar tanto.
Mas são os golpes e os tropeços que nos tornam mais fortes e aos poucos vamos aprendendo que tendo a vida ou a sobrevida toda pela frente não temos mais o direito de esperar que as coisas sejam perfeitas para que sejamos felizes. Temos que aprender a conviver com a incerteza, com a imperfeição e com a idéia marxista de que tudo que é sólido desmancha no ar.
Não tenho os detalhes, mas acho que posso imaginar como Nenê se sente. Aliviado por ter detectado o problema em estágio inicial, pois o tumor ainda não tinha se espalhado para outros órgãos, mas ao mesmo tempo preocupado com seu futuro. Apavorado talvez. Pela primeira vez se depara com a possibilidade real da morte, aos 25 anos.
O fato é que no caso de um tumor benigno tudo é muito simples: depois da cirurgia o problema está solucionado e o paciente volta a uma vida normal. Já no caso de um tumor maligno, mesmo que encapsulado, a coisa já muda de figura, pois simplesmente não há certezas. É nesta hora que os médicos tornam-se reticentes, que os laudos ficam mais complexos e a vida mais confusa. Aliás é justo nesta hora que a gente passa a não ter mais vida e sim sobrevida.
Imagino que o Nenê esteja agora tentando elaborar tudo isto. Se há um mês sua única preocupação era uma contusão nas quadras ou uma cesta perdida, agora ele tem muito mais com que se preocupar. Não tenho dúvidas que o Nenê já é uma outra pessoa depois de passar por isto tudo em tão pouco tempo. Mas se o tumor fosse benigno, ele seguramente poderia varrer tudo para baixo do tapete e continuar vivendo a vidinha de sempre. Tudo não passaria de um pesadelo que teria ficado parar trás. Mas agora, depois de um laudo diferente e definitivo, ele já não tem mais esta escolha. Não dá para enterrar uma experiência destas quando se tem que enfrentá-la a cada três meses, quando se volta ao local do crime rezando para não encontrar novas evidências. Não dá para seguir levando a mesma vidinha de sempre quando ela não se chama mais vida, e sim sobrevida, e você tem que viver em liberdade vigiada pelos próximos cinco anos. Não dá para fazer simples planos sem pelo menos uma vez questionar se vamos durar tanto.
Mas são os golpes e os tropeços que nos tornam mais fortes e aos poucos vamos aprendendo que tendo a vida ou a sobrevida toda pela frente não temos mais o direito de esperar que as coisas sejam perfeitas para que sejamos felizes. Temos que aprender a conviver com a incerteza, com a imperfeição e com a idéia marxista de que tudo que é sólido desmancha no ar.
January 19, 2008
Imagens
Resolvi mudar a ordem do post abaixo. Achei melhor avisar aos desavisados que estou incluindo fotos bem gráficas da cirurgia. Então se você é do tipo mais sensível (como eu sempre fui), pode ir parando por aqui. Não mova o cursor nem mais um milímetro e leia o post seguinte, bem explicadinho e com ilustrações bem didáticas.
Depois do disclaimer acima, sigo em frente. Agora, todo mundo já sabe que este post é para quem tem estômago forte, curiosidade excessiva ou espírito mórbido.
Ontem, pela primeira, vez vi as fotos da cirurgia e revi as fotos do tumor, esta massa doente e silenciosa que habitava meu fígado há tempos...
Pensei se deveria ou não postar as fotos aqui, pois são bem fortes, mas como na minha vida sempre prefiro encarar tudo de frente, isso não seria diferente. E desta forma mostro-me por inteiro, não só despida, mas mostro também as minhas entranhas. Eu, que sempre fui reservada, aos poucos começo a, literalmente, me conhecer melhor, me enxergar de forma diferente, me ver por outros ângulos. E acho que de uma vez por todas entendo que realmente não vim a este mundo a passeio...
Olhando estas imagens dá para ter uma idéia melhor da pauleira que foi esta cirurgia e de quão fundo fui tocada, furada e remexida. Não dá pra passar por uma experiência destas e não repensar a vida. Não dá para ter um troço destes retirado de dentro da gente e não se perguntar o que mais precisa sair. Não dá para olhar para tudo o que passei e me perguntar o que devo tirar desta experiência tão intensa. Como dizem os americanos, some food for thought...
A foto acima é do momento que os médicos chegam ao meu fígado. A aparência de um fígado normal é assim mesmo...a cor vermelha escura, uma textura meio granular.

Acima, a parte do fígado que foi ressecada. O tumor é só uma parte dela, a área mais arredondada. Os médicos operaram com uma margem bem generosa. O tumor tinha uns 6 ou 7 cm de diâmetro e os médicos tiraram quase 13 cm, ou 40% do meu fígado.

Mãos milagrosas cortam, recortam e costuram meu fígado de ouro.
Coisa de filme, não? Pois é, devo ter levado uns 2000 pontos!
Depois do disclaimer acima, sigo em frente. Agora, todo mundo já sabe que este post é para quem tem estômago forte, curiosidade excessiva ou espírito mórbido.
Ontem, pela primeira, vez vi as fotos da cirurgia e revi as fotos do tumor, esta massa doente e silenciosa que habitava meu fígado há tempos...
Pensei se deveria ou não postar as fotos aqui, pois são bem fortes, mas como na minha vida sempre prefiro encarar tudo de frente, isso não seria diferente. E desta forma mostro-me por inteiro, não só despida, mas mostro também as minhas entranhas. Eu, que sempre fui reservada, aos poucos começo a, literalmente, me conhecer melhor, me enxergar de forma diferente, me ver por outros ângulos. E acho que de uma vez por todas entendo que realmente não vim a este mundo a passeio...
Olhando estas imagens dá para ter uma idéia melhor da pauleira que foi esta cirurgia e de quão fundo fui tocada, furada e remexida. Não dá pra passar por uma experiência destas e não repensar a vida. Não dá para ter um troço destes retirado de dentro da gente e não se perguntar o que mais precisa sair. Não dá para olhar para tudo o que passei e me perguntar o que devo tirar desta experiência tão intensa. Como dizem os americanos, some food for thought...
Acima, a parte do fígado que foi ressecada. O tumor é só uma parte dela, a área mais arredondada. Os médicos operaram com uma margem bem generosa. O tumor tinha uns 6 ou 7 cm de diâmetro e os médicos tiraram quase 13 cm, ou 40% do meu fígado.
Mãos milagrosas cortam, recortam e costuram meu fígado de ouro.
Coisa de filme, não? Pois é, devo ter levado uns 2000 pontos!
January 17, 2008
Nenê
Ótimas notícias: o tumor retirado do testículo do jogador era benigno! Acho que isto quer dizer que depois de algum tempo em casa, ele já pode retomar sua rotina. Que alívio! Mais um motivo para rezar e agradecer mais e mais.
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