"Dani, assim não vai dar. Estou com vontade de matar a sua mãe," dizia a voz da minha irmã do outro lado da linha,ligando do trabalho no Brasil. O engraçado é pensar que apesar das palavras dela "a sua mãe", a mãe é dela tanto quanto minha. Detalhes, pensei.
"Como assim? Por que?," fui logo perguntando o motivo da última crise a afetar a família Duran.
"Você lembra das canequinhas que mandei fazer para o batizado da Giovanna, que vai ser em janeiro? Lembra que te mostrei o modelo e o layout delas? O que você achou?," Andressa me perguntava ansiosa.
"Achei bonitinhas," respondi logo.
"Pois é, mas a mamãe odiou! Ligou para cá me esculachando, dizendo que era um absurdo eu oferecer caneca como lembraça de batizado. Disse que era uma coisa tosca, sem classe, um horror. Ainda colocou a coitada da Vovó no telefone para dar razão a ela. Foi falando que a lembrancinha do batizado da Chiara tinha sido fofa e a coitada de Giovanna ia ter lembrancinhas horríveis: canecas grosseiras," a minha irmã se lastimava do outro lado da linha. "Você achou bonitinha mesmo?," ela queria certeza.
"Gostei sim, pelo modelo que vi online. A gente coloca numas bolsinhas bonitinhas, enche de doces e fica lindo," sugeri.
"Ótimo, então vamos ver se a gente acha alguma coisa de organza na internet!," ela logo se animou.
A beleza de internet está aí: solução imediata para seus problemas de qualquer lugar do mundo, a qualquer hora. Santa Amazon! Bendito Google! Amém! Dentro de poucos segundos achamos umas sacolinhas de organza muito fofas. Minha irmã respirou mais aliviada.
"Vou comprar agora mesmo! Depois só preciso ver as balas. Vai ficar bonitinho, não vai?," perguntava ela, no fundo pedindo afirmação.
"Claro que vai," disse eu, sinceramente.
Mas ela continuava a se justificar [que efeito palavras de mãe tem sobre as filhas!]. Acho que a mamãe não entendeu meu objetivo. Pensei em dar uma lembrancinha útil para as pessoas e não um cacareco qualquer que pode ser bonitinho mas não serve pra nada. Eu já tinha dado caixinhas no nascimento das meninas, bloquinho no batizado da Chiara, então achei uma canequinha interessante. Acho que a minha mãe não entende o mundo corporativo. Aqui no trabalho todo mundo usa, até para esquentar sopa. A caneca parece uma verde sua que você deixou na casa da mamãe, nada demais. E de mais a mais, quem não usa caneca para tomar chá ou esquentar sopa pode usar como porta-lápis," ela concluiu já mais tranquila.
Desligamos e eu respirei fundo, voltando a tal matéria que tentava escrever sem muito sucesso.
Alguns minutos depois, o telefone toca de novo. Quem estava do outro lado da linha? Minha mãe!
"Minha filha, estou decepcionada com a sua irmã," ela foi logo me dizendo. "As tais canecas que ela encomendou para o batizado da Giovanna são terríveis!," mamãe foi logo abrindo o verbo. "Não sei onde ela estava com a cabeça quando teve uma ideia destas. Onde já se viu dar caneca de lembrança de batizado? Tinha que ter pelo menos algo religioso."
"Eu sei, Mãe, mas não há tantas opções assim e eu acho caneca legal. Pode ficar bonitinha. Aqui em casa temos aos montes e todo mundo usa. No trabalho idem. A gente já comprou umas bolsinhas de organza muito fofas e, você vai ver, o produto final vai ficar delicado," tentei tranquilizar a minha mãe.
"Não entendo vocês, duas moças finas, gostarem desta ideia de caneca," ela protestou.
Confesso que a frase me parecia mais saída da boca da minha avó. Aliás, quando a gente discorda delas, elas questionam logo a nossa
finesse, que, cá entre nós, deixa bastante a desejar. E depois ainda jogam a culpa na família do meu pai. "Só podia ser mesmo. Espanhol é tudo grosso! Puxaram ao lado do seu pai," minha mãe diz quando perde a paciência ou se vê em muitos argumentos.
Mas de volta à crise: o fato é que as 50 canequinhas já foram compradas e devidamente entregues na casa da minha irmã. A esta altura do campeonato, comprar 50 brindes aqui nos States e levar pro Brasil [como sempre faço] não me parece ideia das melhores, então o negócio é partir para
damage control ou controle de danos. Vou rezar para estas bolsinhas de organza serem o
must, pois só assim minha mãe desencana das tais canecas.Nunca pensei que eu, aqui da pacata Maryland, fosse ter que negociar a paz na Faixa de Gaza, que pelo menos ontem se situava em algum lugar próximo ao Canal de Marapendi, na Barra da Tijuca!