June 1, 2008

Eu, o fantasma

Sexta-feira, o pessoal da ACS aqui de Maryland perguntou se eu toparia ser entrevistada pelo jornal local. Eles ia cobrir nosso evento, Relay For Life, e queriam conversar com um "sobrevivente". Como também faço parte do comitê organizador, meu nome foi sugerido.

Acho até engraçado esta troca de papéis, pois não é a primeira vez que a repórter acaba sendo objeto da notícia. Pensando bem, já estive de todos os lados dela: como repórter, "buscando" a notícia, como assessora de imprensa, "gerando a notícia", e em outros papéis, sendo a própria notícia. Enfim, como adoro notícia de qualquer jeito, topei na hora, pois acho que parte da minha missão agora é contar a minha história.

O repórter e o fotógrafo chegaram. Os dois eram supernovinhos e muito simpáticos. Mal podiam esconder a surpresa ao me encontrar. O episódio me lembrou a matéria que a GNT fez no meu casamento, quando o Happy Hour usou a gente como gancho para um programa sobre amor online. Obviamente, o Blake e eu éramos o caso de sucesso. A surpresa do repórter foi tanta, que quando o programa foi ao ar, ele teve que fazer um "mea culpa" e admitiu ter pensado que estava indo a um "casamento nerd" e ao chegar lá deu de cara com gente mais do que normal.



Hoje não foi muito diferente. Eles chegaram lá achando que ia ser fácil achar alguém com cara de paciente de câncer. Levaram um tempinho pra me encontrar, lá na mesa de informações da ACS. Eles já tinham um briefing meu e queriam mais detalhes da minha história. Quando mais eu falava, mais a expressão deles se tornava assustada. "Duas cirurgias? Duas vezes câncer no fígado? Setenta por cento do fígado retirado? Depois mais quarenta?"

Conforme eu ia contando a minha história, mais sobrenatural ela parecia. De repente parecia que eles estavam falando com um ET, ou melhor, com um fantasma. Com alguém que já deveria ter ido desta para uma melhor, mas por algum motivo louco estava ali na frente deles.

Já me aconteceu várias vezes de notar que as pessoas simplesmente ficam sem palavras. É como se eu tivesse morrido, pois ninguém sabe o que me dizer, justamente como acontece nos velórios. No máximo, a gente escuta um "sinto muito". Graças a Deus, ninguém ousou ainda me dar os pêsames, mas tem gente que chega perto.

No início esta história me divertia um pouco. Acho que lá no fundinho tenho uma parte bem sádica dentro de mim. Agora confesso que às vezes me sinto incomodada, pois é como se, mesmo sem querer, as pessoas tivessem duvidando da minha saúde, da minha habilidade de estar ali. Elas sabem que sou merecedora, mas lá dentro devem achar que meus dias estão contados. A velha história do câncer como sentença de morte.

Até entendo, mas prefiro me referir a este sentimento como a "perda da inocência", pois foi exatamente ali que entendi o significado real da palavra "mortalidade". E de certo modo, foi ali, naquele outubro de 2002 e depois em dezembro de 2007, que tudo ficou mais óbvio para mim. Aquela minha vida de antes acabou, morreu. Nunca mais vai ser igual. Mas em compensação, tive uma segunda e até uma terceira chances, o que é simnplesmente inacreditável. Se a minha vida de antes, morreu, ficou para trás, a minha vida de agora mal começou e é mil vezes melhor.

Então é só aguardar a matéria que sai esta semana no jornal local Carroll County Times. Ainda não é o New York Times, mas já é um começo.

5 comments:

MARIA said...

Danielle,
meu caso e parecido com o seu. Tenho 28 anos e descobri que tenho cancer de figado ha 1 mes atras. Gostaria muito de conversar com voce. Conheco o Pe Sergio, ele foi meu paroco na Santo Afonso, no RIO, durante 12 anos. Achei muita coincidencia. Por favor, entre em contato comigo!!!

Dani said...

Maria,
Que coincidência! Me mande seu email, seu telefone, seu MSN...o que você puder. Como você descobriu? Onde está se tratando? Meu email é dani.m.duran@gmail.com
Beijos e fique com Deus!

Anonymous said...

Parabéns pelo seu dia atrasado! Vou comemorar com minha mãe o dela atrasado tb. Hoje atualizei toda a leitura do seu blog. Queria publicar aqui que adorei o seu curry, a cama e o "meu" banheiro só para mim :-) (quem ficou em albergue entende....)

Mas o que mais amei foi poder estar contigo LINDA, LOIRA, PODEROSA E SAUDÁVEL, graças a Deus! E de sapatilhas! ;-)

Muito obrigada por toda a recepção e o carinho pela minha passagem, pela ida a Washington como uma típica cidadã americana, aqueles 3 dias foram intensos e não tem preço!

Dani said...

Cris,
Adorei ter você aqui e fico feliz de você ter gostado da sua rotina americana. O pessoal do trabalho também te adorou e o meu dia longo e a commute terrivel passaram rapidinho.
Dê um grande beijo na sua mãe por mim e comemore muito com ela.
Beijos
Dani

Anonymous said...

Dani minha querida
Dizer que vc é demais é pouco!
Vc é guerreira, sem deixar de ser doce. Vc é amiga, sem ser espaçosa, vc é inteligente sem deixar de ser humilde.
Você é lição de vida, você é um exemplo.
Vc é motivo de orgulho para nós.
Deus lhe abençôe abundantemente,
Sua mãe Angela