Ontem comentando com uma colega de trabalho sobre a recusa que recebi do plano de saúde, ela disse imediatamente: "Está vendo por que quando a hora chegar eu vou lá para Washington marchar a favor da reforma da saúde? Você é a primeira pessoa do meu círculo que me relata uma coisa destas, mas tem muito mais gente por aí," disse Allison, que normalmente é uma das pessoas mais calmas e ponderadas que conheço. "E ainda tem aquela gente idiota que faz escândalo nos town-hall meetings," ela emendou.
E ali, naquele momento, tive certeza absoluta de que lado eu estava. Claro que sempre fui e serei a favor da reforma deste sistema de saúde tão perverso, mas sem ler as mais de mil páginas do tal documento, simplesmente não me sentia à vontade de tomar uma posição mais clara, ou seria radical? Ontem, mais uma vez, vi que eu havia tomado esta posição há muito tempo, só não tinha enxergado isto ainda e conversando com a Allison ficou tudo muito claro.
Voltei para o escritório e recebi o email da Melody, uma mulher de 56 anos que descobriu há pouco um câncer no fígado e buscava alguém que tivesse passado por experiência parecida. Ligou para a Immerman Angels, organização do Jonny, e recebeu meus dados de contato.
Melody me conta que recentemente descobriu ser portadora do vírus da hepatite C, que causou-lhe cirrose hepática que evoluiu para câncer. Ao que tudo indica, sua única salvação é um transplante, mas pelo tamanho e localização do tumor, não é possível/indicado. Só lhe resta então tentar radioterapia/quimioterapia para tentar diminuir o tamanho do tumor para depois quem sabe poder pleitear o transplante. Mas apesar de ter plano de saúde, o pedido de seu médico foi NEGADO!!!! Melody então me pergunta como ficar otimista numa situação destas!
Como?! Ficar otimista quando pessoas sórdidas e mesquinhas lhe negam o direito de viver?! Não faço a menor ideia! Enfrentar uma doença como esta sem perder a cabeça já uma tarefa e tanto. Enfrentar esta doença e ainda ter que lidar com a crueldade de terceiros é missão impossível. A que ponto chegam a ambição e pequinez do ser humano?!
Quando o assunto é saúde e principalmente o acesso a ela, saio do sério. Claro que percebo o quanto tenho sorte em todos os sentidos -- tive um tumor que pode ser ressecado, minha família tinha condições financeiras para custear o tratamento, o seguro-saúde nos reembolsou boa parte das despesas. Infelizmente a maioria das pessoas não tem a mesma sorte.
Então pensei num cenário um pouquinho diferente: eu, solteira, perco meu emprego ou saio dele para realizar o sonho de começar meu próprio negócio de consultoria de comunicação e marketing, por exemplo. Eu, que sempre ouvi dos meus pais que poderia fazer tudo que eu quisesse, que estudei, que trabalhei sério, que sempre acreditei que com instrução e competência seria capaz de tomar conta de mim mesma, me sustentar e viver a vida que sonhei para mim, de repente percebo que nada disto é verdade. A verdade é que por algo completamente alheio a minha vontade, por algo do qual não tive a menor culpa, serei eternamente presa a um emprego, por mais desisteressante que seja, que me dê os tais benefícios, como plano de saúde, de preferência um bom, que cubra os tantos exames e consultas que faço a cada ano. A verdade é que mesmo disposta a pagar uma fortuna por algum tipo de cobertura médica, nenhum plano irá me considerar por causa daquele famoso "C" que eu levo no meu boletim.
E nestas horas o mundo me parece mesquinho e pequeno demais. Injusto e desigual. Felizmente não preciso me preocupar tanto assim com o tal plano de saúde, pois tenho algumas alternativas, mas milhares de pessoas como a Melody não tem. Milhares de americanos tem planos de saúde mas são reféns deles quando realmente precisam dos recursos mais avançados. Outros milhares -- ou seriam milhões -- sequer tem plano, pois seus empregadores não oferecem. Como aqui não há SUS, só que está abaixo do nível de pobreza se qualifica para o Medicaid, assistência do governo, e Medicare é só para idosos. Claro que tem muita gente, incluindo imigrantes ilegais, que abusam do sistema, mas como sempre a grande maioria acaba sendo prejudicada por uma minoria irresponsável.
Ainda não entendo completamente as propostas de reformas do sistema de saúde, mas só sei que do jeito que está não pode ficar. É por estas e outras que agora só aguardo o chamado. Obama, quando chegar a hora de marchar em Washington, me chama que eu vou!
1 comment:
e se por acaso tu acha pouco ter um plano de saúde te "negar" experimenta tentar fazer um seguro de vida... a coisa é bemmm complicada... scarlet letter total... don't even get me started..
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