April 10, 2009

Histórias

Desde pequena, a minha mãe sempre me disse que a palavra tinha um poder enorme. "Quando você pensar que não há nada que possa oferecer para alguém, ofereça uma palavra de conforto, um ombro amigo," ela sempre me diz. Eu reclamo às vezes, pois sinto que em tantas ocasiões palavras se perdem ao vento. Gosto é de ação! Não gosto de blablablá e tenho horror a demagogia, então acho que palavras só valem a pena quando seguidas por ações coerentes.

Mas estes dias tenho pensado justamente nas palavras da minha mãe e até nas palavras de outras pessoas. Se tenho lá minha s dúvidas quanto ao poder das palavras, acredito piamente no efeito das histórias, estas sim, a meu ver, mudam vidas.

Semana passada ao ver o Todd, falei da Paula, amiga virtual e transplantada há 15 anos. Ao ouvir "15 anos", Todd abriu um enorme sorriso, pois no meio de tantas estatísiticas sombrias e frias e de tantas especulações, eu ali lhe dava um fato, lhe contava a história de alguém que passou pelo que ele está passando e está viva e feliz.

Naquele momento, ao lhe contar aquela história real, dei ao Todd também esperança, pois a certeza da existência de alguém que sabe exatamente o que ele passa, mostra que é possível vencer a batalha. "Quinze anos...," ele repetia para si mesmo. "Quinze anos é coisa para caramba!," ele me dizia e sorria. Um sorriso nos lábios de alguém que está deformado por conta de uma doença covarde tem um sabor e uma beleza ainda mais especiais.

A verdade era que tinha entrado naquele quarto para contar a ele a minha história de sucesso "Ei, olha pra mim! Hoje estou aqui maquiada e de salto alto, trabalhando full-time e feliz da vida, mas ano passado, estava numa cama de hospital, cheia de fios e furos como você..." Já tinha meu discurso todo engatilhado. Mas ao longo da nossa conversa, vi que a história que importava ali não era a minha, mas a dele. E a história que ia fazer a diferença não era a minha, mas a da Paula, que tinha muito mais para contar para o Todd naquele momento. Então imediatamente, aposentei a primeira pessoa e contei a história dela, na terceira pessoa, a pessoa certa para estar ali ao lado dele. Passei de protagonista a narradora, pois se fisicamente a Paula não poderia esta aqui em Baltimore, me esforcei o máximo para que a sua presença pudesse ser sentida naquele momento, através das minhas palavras.

O legal foi que depois de ver o post de semana passada, a Paula demonstrou a maior vontade de ajudar, de se conectar com o Todd, mesmo que à distância. Tratou logo de colocar sua história no papel, de falar sobre momentos bons e ruins e de abrir seu coração para alguém que ela jamais conheceu.

Traduzi a carta e levei para o Tood ontem, junto com o livro autografado da Kairol. Ao chegar, disse para ele que tinha comigo uma carta da minha amiga Paula, ao que ele completou na hora "aquela que fez o transplante há quinze anos!" Já haviam se passado vários dias mas a história da Paula continuava viva na memória dele! Estendi a mão e dei a carta para ele, fui avisando que tinha fotos dela. Ele, curioso, olhou para a carta e para a foto dela e disse meio sem graça "Saudável e bonita!" Agora ele tinha além da história, uma evidência de que a Paula de fato existia e uma foto, um rosto, coisas que tornam tudo muito mais real.

E ali eu entendi que se a doença não tem preferência por sexo, raça, cor ou religião, também a solidariedade e os laços que podem unir pessoas que aparentemente tem muito pouco em comum, não conhecem fronteiras. Ali, naquele quarto de hospital, a pessoa que mais entenderia o Todd, não era um médico, uma enfermeira ou mesmo uma assistente social. Também não era eu, uma ex-paciente, mas sim uma empresária paulista de 39 anos que ele jamais viu, mas que deu a ele algo que só um transplantado de medula pode oferecer, a esperança e no caso da Paula, a certeza, de que há vida depois de um duro golpe como estes e que ela continua mais interessante do que nunca.

Desde que comecei a escrever o blog, tantas destas histórias chegaram até mim. Histórias de jovens valentes que viviam vidas absolutamente normais ao se depararem com circunstâncias completamente anormais. Uns, como a Paula, ainda estão aqui, outros infelizmente partiram, mas deixaram também seus legados e suas histórias, não menos belas apesar de tristes, mas que também merecem ser contadas.

Estou pensando em abrir o blog para estas pessoas que continuam a viver vidas produtivas, interessantes e NORMAIS e amigos e/ou familiares daqueles que já não estão mais entre nós. Acho que muita gente vai gostar de conhecer, ao menos virtualmente, tantas pessoas especiais. Aos que preferirem, posso omitir ou mudar o nome para proteger a privacidade. Então fiquem à vontade para dividir suas histórias. Já tenho duas que dariam roteiro de Hollywood e vou perguntar as "personagens principais" se elas me deixam postar aqui...

Sendo assim, aguardemos todos as cenas dos próximos capítulos!

1 comment:

Glaucia Fonseca said...

Dani, acho ótima a iniciativa de contar estas histórias, que precisam ser ouvidas por tantos. Muito bonito você transformar sua experiência em algo que pode ajudar os outros, às vezes algumas palavras já fazem uma diferença enorme.