October 30, 2011

Câncer e Privilégio

Antes de qualquer coisa, digo que mais do que a maioria das pessoas, me solidarizo e muito com o nosso Presidente Lula. Sei, como poucos, e senti na pele o que é não ter nenhuma certeza ou nehuma garantia do sucesso de um tratamento difícil contra uma doença covarde e vil.

Nos últimos cinco anos já fui testemunha de muitas histórias de luta, de superação, mas também de desespero e de dor que afetaram pessoas queridas e seres humanos especiais. Por isto, não vejo câncer como castigo, ironia, punição ou coisa parecida. Também não acredito que os bons se salvam, já que alguns dos seres humanos mais iluminados que passaram pelo meu caminho já não estão por aqui.

Mas o que sempre me incomodou bastante foi perceber que mesmo diante de uma doença covarde e aparentemente democrática -- que não escolhe cor, raça, sexo, credo, classe social ou estado civil -- nem todos podemos lutar em igualdade de condições. Sem querer procurar culpados e buscar bodes expiatórios, a verdade é que nesta hora, vive que pode mais, vive quem tem mais.

Duas jovens da mesma idade tiveram a mesma doença. Uma tinha um bom plano de saúde, sendo assim, foi operada imediatamente, recebeu tratamento com rapidez, teve acesso aos melhores médicos e a hospitais de ponta. Hoje está viva, feliz e saudável. A outra não tinha plano de saúde, passou por vários hospitais, teve muita dificuldade para realizar uma mera tomografia, teve várias consultas médicas adiadas. Quando enfim conseguiu chegar ao especialista, já era tarde demais. Morreu em seis meses. No caso das duas jovens, a princípio, solução seria a mesma, mas o resultado...ah o resultado infelizmente não poderia ser mais diferente. Por quê?

Como eu conheço estas histórias? A primeira jovem era eu: 28 anos, filha mais velha de um homem chamado Francisco que tinha mais dois filhos (uma menina e um menino), carioca, católica, e cheia de planos e de vida. A segunda jovem era a Thalita: 28 anos, filha mais velha de um homem chamado Francisco que tinha mais dois filhos (uma menina e um menino), carioca, católica, e cheia de planos e de vida. Tantas semelhanças mas uma diferença enorme que pode ter custado a vida da Thalita.

Destino? Até pode ser... Cada um tem a sua hora, muita gente insiste em dizer. Gostaria de me conformar com esta ideia também, mas no fundo me dói muito saber que mesmo tendo um equalizador tão cruel como o câncer, na hora da batalha nem todos têm condições iguais.

Pouco me importa onde o Lula vai se tratar, se é no Einstein, no Sírio Libanês, em Johns Hopkins ou em Harvard. Desejo a ele muita força, fé e coragem, o mesmo que desejei e desejo aos meus melhores amigos que atravessam situação semelhante e o mesmo que pedi a Deus a cada noite durante muito tempo...

Mas além disto, desejo também que o Brasil e o mundo se tornem lugares mais justos, onde não só os privilegiados -- como o Lula ou como eu -- tenham direito a um tratamento eficaz e digno. Sem ironia nenhuma, sem nenhum desrespeito, do fundo do meu coração, gostaria, sim, de que todos os pacientes que hoje se tratam no SUS tivessem as mesmas chances que o presidente e que eu tivemos.

10 comments:

Luciana Bordallo Misura said...

Eu juro que estou chocada com as pessoas no Facebook falando bem-feito pro Lula e coisas do tipo...nao desejo cancer pra ninguem.

Dani said...

Eu também, Lu. Acho que câncer não é bem feito para ninguém e qualquer paciente merece respeito e solidariedade numa hora destas.

A menina e os pensamentos said...

Mesmo que o Lula tenha dito que nosso sistema de saúde está beirando a perfeição, sabemos que ele sabe que não é isso. E que bom que ele poderá tratar-se como qualquer ser humano merece: com bons médicos e hospitais. Eu também gostaria que as oportunidades fossem iguais para todos...

Anonymous said...

Muito bem colocado, Dani. Concordo plenamente.
Um beijo
Gaby (gabgaby)

Andanhos said...

Dani, é muito triste e revoltante as pessoas não terem as mesmas condições para cuidar de sua saúde!
Tenho respeito e admiração pelo Lula e, ainda que não gostasse dele, torceria -e torço!- para que ele se recupere e fique bem.
Mas acho que esta seria uma oportunidade para os políticos brasileiros repensarem a situação da saúde pública e investirem mais nela. E punirem com maior rigor qualquer desvio!
Se o SUS fosse sinônimo de qualidade, ninguém teria ficado revoltado com a campanha para o Lula se tratar por ele, não é verdade?
Sei que há coisas que funcionam bem no SUS, mas ainda faltam muitas outras! E quando o tema é saúde não dá para esperar.
Fiquei emocionada com a história da Thalita. Que ela esteja em paz!
Beijos.

Dani said...

Liège,
Concordo 100% com o que você disse... Se o SUS fosse tão perfeito ninguém teria se ofendido com a ideia do Lula se tratar por ele. Seria bom se este tema fosse realmente levado a sério por quem pode mudar as coisas...
Bjs e obrigada pela visita!

Monica Lima said...

Li tantas barbaridades sobre esse tratamento do Lula que chega a dar nojo. Seu texto foi perfeito, também não desejo o mal de ninguém e quero mais é que ele se recupere, seja pelo SUS ou pelo plano de saúde.

Beijo!

Dani said...

Monica,
Obrigada pela visita. Vamos juntas torcer pela recuperação do Lula e do sistema de saúde do Brasil.
Beijos!

Cristina said...

Vc é uma vitoriosa e obrigada por não deixar de levantar a bandeira, sobretudo de pessoas como a Thalita....

Anonymous said...

Achei seu blog ano passado buscando ideias de um convite de casamento bilingue.. E descobri diversas afinidades, como o fato de minha mae ter vencido um cancer (assim como voce! que orgulho!). Tb to aqui, casada com um gringo, na terra do tio Sam que adoro, mas acho que nunca serah como o Brasil. Um beijo enorme, saude e luz para voce!! Vc eh uma guerreira!! Paola